Tornar a pesca justa e sustentável
11 de outubro
8:00 Visita à Lota | 9:00 Reunião com Lotaçor | 15:30 Reunião com a Espada Pescas
José Azevedo e Ana Filipa Castro visitaram a entidade que controla a primeira venda de pescado nos Açores, para além de assegurar as condições necessárias à produção, distribuição e comercialização do pescado.
Reuniram também com uma empresa de pesca, transformação e comercialização de pescado numa perspetiva reguladora, procura de novos mercados e de garantia de rendimento sustentável aos pescadores.
O objetivo foi conhecer melhor o mercado do peixe em São Miguel, discutindo a visão do LIVRE da necessidade de aumentar o rendimento dos pescadores através da intervenção cooperativa no mercado de compra e distribuição de pescado.
E como foi este dia?
” [neste dia] falámos de pesca e falámos de pobreza, e até vimos como as duas questões se relacionavam. Neste texto vou concentrar-me na pesca (e falarei de pobreza); no próximo falarei de economia solidária, que tem como foco a pobreza mas também muitas outras formas de exclusão.
No Programa Eleitoral do LIVRE foram idenficados dois problemas relacionados com as pescas. Pelo lado dos peixes, do recurso, há uma sobreexploração que necessita de ser travada. As capturas têm vindo a descrescer continuamente ao longo dos últimos 20 anos, apesar do aumento do número de barcos e de pescadores. Como partido ecologista, o LIVRE defende que a natureza impõe limites de sustentabilidade que devem ser respeitados a bem das gerações futuras. Para isso defendemos a criação de áreas protegidas que cubram uma parte significativa (20-30%) de cada tipo de habitat. Pelo lado dos profissionais da pesca, há rendimentos de miséria que resultam da forma como está estruturada a cadeia de valor. Esta situação é particularmente evidente na ilha de São Miguel, onde muitos pescadores recebem em média 150 a 200 euros mensais. No programa defendemos que os pescadores se organizem de forma a poderem atuar a nível da comercialização e venda, de modo a captar mais rendimento.
Nestes dias efetuámos contactos com entidades do setor da pesca, desde uma organização de produtores a uma empresa pública com a função de reguladora do mercado, passando pela entidade responsável por regular a 1ª venda.
Ficámos a compreender melhor o importante papel desempenhado pelas empresas públicas neste setor. Poucas pessoas saberão, por exemplo, que a Lotaçor paga a pronto aos pescadores mas recebe a 30 dias ou mais dos compradores. Esta postura de apoio ao setor exige um esforço financeiro importante para a empresa, o qual tem apenas uma justificação social e não económica. Poderia fazer uma longa lista das intervenções da Lotaçor mas deixo apenas mais duas: é a empresa que gere os descontos para a segurança social dos pescadores e que lhes fornece a custo zero as casas de aprestos. A Espada Pescas, por seu lado, foi criada para moralizar o mercado de 1ª venda, e tem um papel crítico a esse nível sobretudo nas ilhas pequenas onde há poucos compradores e portanto mais possibilidades de distorção do mercado. Por este lado, os Açores são pioneiros.
Porém ficámos muito preocupados com dois assuntos muito graves e a precisar de intervenção política imediata, uma interna e outra a nível europeu. A europeia, primeiro.
As atuais regras europeias de gestão das pescas têm uma base científica de exploração dos recursos que é essencial. Do nosso ponto de vista, faz sentido que os recursos naturais sejam geridos a uma escala geográfica compatível com a sua realidade biológica, e essa escala é muitas vezes a europeia. O problema, porém, é que há muitos elementos da Política Comum de Pescas que são incongruentes com os objetivos dessa mesma política.
Veja-se o caso do goraz: os especialistas avisam para a sobreexploração do recurso e recomendam reduções das capturas. Nada a opor, aqui. A União Europeia toma este conselho e transforma-o numa proibição de desembarque. Percebem a diferença? A UE impede que os pescadores desembarquem o peixe, não que o capturem! Num contexto de pescarias multiespecíficas, nas quais é impossível controlar o que vem no anzol, o que pensam que deve fazer um barco que capture um goraz que vale 5 ou 10 euros e que já chegou morto ao barco? A UE não diz, mas pode criticar-se que os pescadores procurem mecanismos, mesmo que ilegais, de valorizar esse pesca? A fuga à lota é um fenómeno preocupante, e muito dela deriva de regras mal pensadas. Só uma ação dirigida aos mecanismos da PCP poderá ser efetiva aqui. Gritar pelo aumento da quota do goraz só nos faz perder a razão.
A nível regional, é urgente a intervenção política na relação entre a produção e a comercialização e distribuição de pescado que defendemos no programa, mas é mais urgente intervir na relação contratual entre armadores e assalariados da pesca. Ficámos a saber que a maioria dos pescadores (leia-se os trabalhadores por conta de outrém) não tem contratos de trabalho, sendo os seus rendimentos calculados com base nas capturas efetuadas, seguindo um sistema de quinhões que vem da época medieval. Este sistema é vulnerável, sobretudo em São Miguel, à utilização por armadores com poucos escrúpulos para explorar as pessoas que trabalham para si, fazendo uma divisão incrivelmente desigual dos rendimentos. Há muito trabalho a fazer para formar e informar os pescadores sobre os seus direitos, mas não é possível que o poder político continue permitir a manutenção de um sistema tão iníquo.”
Do nosso Programa Eleitoral:
“O esforço de pesca nos Açores tem crescido continuamente, com mais e melhores barcos e com técnicas de pesca mais eficientes, mas a quantidade de peixe desembarcado tem vindo a diminuir constantemente nos últimos 20 anos. O peixe está cada vez mais caro, mas os pescadores recebem cada vez menos. Os Açores necessitam de um setor pesqueiro vibrante e dinâmico, que assegure um rendimento digno a todos os elementos da fileira e contribua positivamente para os setores circundantes. Mas precisa também de ecossistemas marinhos saudáveis e produtivos. Conciliar estas duas realidades é possível, mas exige opções políticas claras na defesa do ambiente e de quem vive do mar.”
PARA UMA PESCA JUSTA E SUSTENTÁVEL O LIVRE DEFENDE:
- Aumento das mais valias para os pescadores
Deve ser favorecida uma economia solidária e colaborativa para que os pescadores possam, através de associações de classe e de cooperativas, intervir de modo a captar uma proporção significativa do valor gerado pela atividade. A formação profissional e o apoio à integração de jovens qualificados na fileira da pesca é essencial para dar autonomia ao setor.
- Criação de reservas marinhas integrais em todas as ilhas
Uma parte significativa (20-30%) dos habitats marinhos de cada ilha deve ser integralmente protegida para permitir a regeneração dos recursos e encorajar as atividades não extrativas, como o mergulho.