Petição: Agir, em Portugal e na Europa, para salvar a Amazónia
Suspenda-se a ratificação do acordo UE-Mercosul enquanto não houver, por parte do governo brasileiro, garantias de preservação do meio ambiente e aceitação de mecanismos de verificação cientificamente independentes contra o desmatamento e o desrespeito pelos direitos dos povos indígenas.
Portugal não pode ficar silencioso perante a destruição da Amazónia.
A União Europeia não pode ficar inativa perante Jair Bolsonaro.
Aos órgãos de soberania da República Portuguesa;
Exmo. Sr. Presidente da República;
Exmo. Sr. Primeiro-ministro;
Exmo/as Srs/as. deputados e deputadas;
Considerando que:
– A Amazónia é o pulmão do planeta, sendo responsável por cerca de 20% do oxigénio libertado e 20% da água doce produzida globalmente;
– A Amazónia é um dos últimos grandes redutos da biodiversidade mundial, representando mais de metade da área total de floresta tropical, com mais de 2 mil espécies de aves e mamíferos, mais de 2 milhões de espécies de insetos e mais de 16 mil espécies de plantas – muitas delas endémicas e ameaçadas;
– A Amazónia é fundamental para o combate global às alterações climáticas, sendo o mais importante sumidouro de carbono do mundo, assumindo cerca de 22% do sequestro global do carbono emitido para a atmosfera;
– Na Amazónia e nas regiões circundantes vivem há milénios povos indígenas cujos direitos têm vindo a ser desprezados e que enfrentam agora uma situação potencial de genocídio.
Os órgãos de soberania da República Portuguesa, em nome próprio e através das instituições da União Europeia, não podem ficar silenciosos nem inativos perante as política do presidente da República Federativa do Brasil, Jair Bolsonaro, que têm vindo a agravar uma situação que já era crítica e que necessita agora de uma ação urgente. Jair Bolsonaro esvaziou politicamente o Ministério do Meio Ambiente, confrontou e deslegitimou os cientistas do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que faziam as medições de indicadores essenciais para a preservação dos ecossistemas brasileiros e mundiais, e atacou as competências da FUNAI (Fundação Nacional do Índio) mostrando claramente que estaria sempre do lado dos garimpeiros, madeireiros e agro-industriais que dependem do desmatamento da Amazónia. A continuar a este ritmo, a destruição da Amazónia atingirá um ponto de não-retorno com consequências gravíssimas para todo o planeta.
Portugal e a União Europeia têm, contudo, uma ferramenta decisiva para intervir nesta situação. Após vinte anos de negociações, o acordo de comércio UE-Mercosul encontra-se em fase de aprovação num ambiente de grande expectativa por parte das elites políticas e económicas brasileiras. Embora este acordo contenha algumas cláusulas de respeito pelo meio ambiente e pelo acordo de Paris, é agora evidente que a Europa não tem em Jair Bolsonaro um interlocutor de boa fé nestes temas. Deve então ser deixado claro que o acordo UE-Mercosul não será ratificado enquanto não forem prestadas garantias adicionais em matéria de proteção ambiental e nele inseridos mecanismos cientificamente independentes de verificação dos compromissos já assumidos e a assumir pelo governo brasileiro de forma publicamente assumida e legalmente vinculativa.
Adicionalmente, o governo português deve suspender as preparações para uma hipotética visita de estado de Jair Bolsonaro a Portugal enquanto não houver da parte do presidente brasileiro uma declaração política de boa-fé na aceitação destes pressupostos.
A médio prazo, defendemos a criação de um Tribunal Internacional contra os Crimes Ambientais e de um Fundo Global de Preservação que apoie os países que desejarem proteger o seu património ambiental de potencial sistémico global contra a destruição e o extrativismo.
Mas, no imediato:
– Os órgãos de soberania da República Portuguesa não podem continuar silenciosos perante esta destruição da nossa casa comum. Urge uma clara tomada de posição pública do Sr. Presidente da República e do Sr. Primeiro-ministro;
– O governo de Portugal deve comunicar ao Conselho da União Europeia que não estará disponível para prescindir da aprovação do acordo UE-Mercosul pela Assembleia da República, uma vez que ele tem um impacto que vai muito para lá de um vulgar acordo comercial; *
– Os deputados e deputadas à Assembleia da República devem aprovar uma moção informando o Parlamento Europeu e o Congresso Brasileiro de que não aprovarão o acordo UE-Mercosul sem garantias adicionais de respeito pelo meio ambiente e pelos direitos dos povos indígenas e criação de mecanismos cientificamente independentes de verificação destas garantias.
* No Direito da União Europeia os Acordos Comerciais apenas são aprovados pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia, sem necessidade de aprovação pelos parlamentos nacionais. O LIVRE entende que o Acordo UE-Mercosul deve ser classificado como acordo misto e portanto ser sujeito à aprovação dos parlamentos de todos os Estados-Membros. Neste sentido é que defendemos que o Governo deve comunicar que não irá prescindir da votação do acordo UE-Mercosul pela Assembleia da República. Apenas desta forma a AR poderá tomar posição sobre o acordo, bloqueando a sua aprovação até à obtenção de garantias de proteção do meio ambiente e respeito pelos direitos dos povos indígenas.