A Assembleia do LIVRE, reunida ontem na sua 80ª reunião plenária, deliberou a posição do LIVRE relativamente ao Orçamento do Estado para 2023 no sentido da abstenção na votação da generalidade, permitindo ao LIVRE a negociação na especialidade de medidas que respondam à emergência social e ambiental. Apenas um compromisso sério do Governo nesta negociação evitará um voto contra o Orçamento do Estado na votação final global.
A proposta do Governo para o Orçamento do Estado (OE) para 2023 segue uma lógica de prioridade à consolidação orçamental que não responde às necessidades dos cidadãos e das famílias portuguesas no período que atravessamos, e que se antevê cheio de desafios a somar à emergência climática e ambiental e à necessidade de repensar o modelo de desenvolvimento vigente. Esta não é a estratégia do LIVRE. Em seu lugar, o LIVRE optaria por dar prioridade à responsabilidade social e ambiental, dentro dos critérios de estabilidade orçamental, ajudando as pessoas a evitar o pior da crise e a economia a resistir aos riscos de inflação.
Esta proposta não só prioriza a redução da dívida pública, através de uma despesa contida, apoiada no PRR, em detrimento de um aumento real dos rendimentos da maioria da população, como também dita uma falsa escolha entre “contas certas” ou rigor orçamental e a continuação do caminho de recuperação de rendimentos iniciado nas anteriores legislaturas. Este é o momento de renovar o compromisso com os portugueses e demonstrar que aprendemos com a experiência falhada da austeridade. Tal como amplamente demonstrado na fase inicial da pandemia, a saúde da economia depende diretamente do rendimento disponível das famílias e do apoio aos setores económicos mais afetados pela conjuntura económica externa. Foi graças às medidas que asseguraram os orçamentos das famílias, os rendimentos dos trabalhadores e a tesouraria das empresas que pudemos ver o início de uma recuperação com o fim do confinamento generalizado.
O governo prefere um orçamento contido, que seria adequado num momento de crescimento da economia e com inflação em níveis normais, mas que acaba assim por agravar a probabilidade da recessão, que considera improvável mas para a qual quer estar preparado.
As contas públicas condicionam as opções que cada governo ou nação pode tomar na hora de decidir sobre receita, despesa e programas orçamentais mais ou menos fundamentais. Não é por isso irrelevante a preocupação com a diminuição da dívida pública na medida em que esta limita o preço a pagar pela sua manutenção ou por cada nova procura de financiamento por parte do Estado. Contudo, um cenário inflacionário como aquele que atravessamos tem um efeito lateral de redução do rácio da dívida pública e dá-nos tempo adicional para atingir os objectivos inicialmente traçados. Por este motivo vemos outros países da União Europeia a optar por centrar a sua política orçamental no aumento real e significativo dos rendimentos, das prestações sociais e em medidas direcionadas para as pequenas e médias empresas. Nesta proposta de OE, caberá à classe média o ónus de suportar o impacto da inflação e os serviços públicos são condenados à estagnação, nos casos em que não sofrem cortes nos seus orçamentos.
Neste sentido, o LIVRE trará para esta discussão medidas que consideramos urgentes e importantes para aumentar a resiliência do país sem abrandar por um momento o investimento no reforço da qualidade e recursos disponíveis nos serviços públicos fundamentais como a saúde ou a educação.
Mais uma vez, o LIVRE não compreende que o Governo não reconheça a importância da criação de uma empresa pública de hidrogénio, num setor que apresenta lucros desmesurados ano após ano – o energético – e que, na medida em que representa um bem fundamental, deve ter uma presença do setor público como garante de acesso, desenvolvimento e inovação.
No orçamento anterior, várias medidas propostas pelo LIVRE acolheram o consentimento do governo. Acompanhamos com atenção e exigência a sua execução, para que possam fazer a diferença na vida das pessoas, no conforto térmico das suas casas e na baixa da fatura da energia, no reforço da rede de proteção das vítimas de violência doméstica através do subsídio de desemprego ou no estudo de novas formas de nos organizarmos em torno do trabalho como é a semana de 4 dias – que esperamos ver sair do papel, na forma de projeto-piloto, muito em breve.
Não nos escusaremos de insistir na concretização das propostas do LIVRE já aprovadas, como é exemplo a mais recente sobre os créditos à habitação, que garante que os bancos oferecem alternativas a quem vê a sua prestação aumentar de forma assinalável, face ao aumento de indexantes como a Euribor, e assim terão a possibilidade de se escudar da escalada das taxas de juros renegociando a dívida e transferindo o crédito para modalidades com taxa fixa que preservem a taxa de esforço recomendada pelo Banco de Portugal — sem possibilidade de obstáculos ou penalizações.
Do mesmo modo, durante o diálogo com o Governo sobre o orçamento para o próximo ano, o LIVRE colocará em cima da mesa medidas como o passe ferroviário nacional, a criação de um serviço de transporte escolar público, o reforço da dotação da Cultura e muitas outras que irão sendo apresentadas ao longo do processo de discussão na especialidade.
O LIVRE defende uma estratégia orçamental ancorada em opções económicas e fiscais que atendam à emergência social e ambiental como prioridades, bem como à garantia de serviços públicos de qualidade. Isso significa que estamos disponíveis para dialogar com cada um dos ministros, após um voto de abstenção na generalidade, procurando ir ao encontro do que os nossos eleitores esperam do LIVRE na discussão em especialidade.
Esta posição assume que apenas com um compromisso sério do Governo em relação a propostas de alteração substantivas e com real impacto que o LIVRE venha a submeter é que poderemos aceder a votar de outra forma que não contra, no momento da votação final global.