Portugueses e europeus, donos do nosso futuro
O programa do LIVRE às europeias 2014 é o mais completo, fundamentado e transformador de todos os programas apresentados a eleições em Portugal. É também o mais democrático, na forma como foi construído — através de um processo de participação aberta a todos os cidadãos — e nos objetivos a que se propõe. Conheça as nossas bandeiras de campanha e explore todas as nossas medidas para mudar mesmo a União Europeia.
Como a troika, o Tratado Orçamental foi gerado pela obsessão da austeridade. Trata-se de um Tratado Intergovernamental, realizado fora dos Tratados da União Europeia, inútil para deter o pânico nos mercados. Com as suas disposições contra a despesa pública, o Tratado Orçamental restringe significativamente as opções de política orçamental dos governos e parlamentos nacionais, proibindo-os de fazer exatamente aquilo que deve ser feito em período de contração económica — investir para impedir uma espiral recessiva e sair do buraco – e reduzindo as eleições a uma mera formalidade esta “ilegalização do keynesianismo” foi inútil no seu objetivo anunciado — o fator estabilizador acabou por vir do anúncio de Mario Draghi de que o BC “faria tudo o que fosse necessário” para salvar o euro — e põe em risco o próprio projeto europeu, ao condicionar os tratados e instituições da União, laboriosamente construídos durante gerações, aos ditames de um tratado escrito durante uma madrugada e cego às necessidades da população europeia.
Os próximos anos são decisivos para eliminar esta monstruosidade: até 1 de janeiro de 2018, segundo as suas provisões, o Tratado deverá estar integrado no acervo comunitário. O significado desta data é claro: uma maioria de direita no Parlamento e na Comissão durante o próximo mandato significa austeridade para sempre. Para impedir esse enquistamento dos Tratados da União pelo Tratado Orçamental, é fundamental que haja uma maioria de frente progressista no Parlamento Europeu e uma Comissão apoiada por essa maioria em Bruxelas, que permita ao Tratado Orçamental morrer de morte natural a 1 janeiro de 2018 — ou, se possível, ainda antes disso. Caso esteja representado no Parlamento Europeu, o LIVRE fará parte de todos os esforços para que cesse a participação das instituições comunitárias em programas de austeridade, revogando o sistema de vigilância orçamental (six-pack) que instituiu a vigilância austeritária sobre os governos nacionais, e reforçando todas as possibilidades de escrutínio democrático e veto parlamentar sobre estes programas, enquanto eles durarem. O apoio do LIVRE a uma Comissão Europeia presidida por um dos candidatos progressistas estará sempre dependente da implementação de uma agenda de investimento e emprego e da inversão de rumo em relação à política imposta pelo Tratado Orçamental à UE e aos seus estados-membro.
A troika foi uma criação ad hoc dos governos dos estados-membro e é um bicho estranho. Duas partes da troika — a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu — são instituições da União e, como tal, estariam obrigadas a respeitar os Tratados e a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais. Mas a ação da troika vai contra a letra e o espírito dos Tratados, em particular do artigo 3 do Tratado sobre a União Europeia, que estabelece como objetivos da União a solidariedade, a coesão e o pleno emprego. As violações da Carta foram também já objeto de análise jurídica convincente. Um relatório do Parlamento Europeu comprovou que a troika violou até o seu próprio mandato ao chantagear os governos dos estados-membro sob programa e ao arrogar-se de poderes de decisão que não lhe tinham sido atribuídos. O estabelecimento, ação e medidas da troika foram das mais escandalosas violações do acervo da União, e estas violações não foram ainda levadas ao Tribunal de Justiça da União Europeia porque apenas os governos dos estados- membro poderiam fazer a queixa.
O LIVRE está decidido a pôr fim a esta passividade. Mesmo um país endividado que tenha pedido soberanamente um programa de apoio não pode ser sujeito a um tratamento ilegal. 1) Qualquer governo português apoiado pelo LIVRE, ou no qual o LIVRE participe, deve explorar a via processual junto do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e obter compensação pela aplicação de medidas da troika que vão contra o acervo comunitário ou os Tratados da União. 2) Em alternativa, um caso submetido aos tribunais portugueses pode dar origem a uma questão pré-judicial ao TJUE, recurso jurídico que permitirá esclarecer definitivamente os pontos de direito e estabelecer a base para futuras compensações pelos danos causados. 3) Em coordenação com os outros países sob programa, esta estratégia poderá levar a uma negociação política com as instituições europeias e os restantes estados-membro para obter essas compensações através de um programa de recuperação e reconversão da economia nacional (ver abaixo). 4) A partir do Parlamento Europeu, o LIVRE participará nos passos subsequentes à investigação da troika propondo que o próprio PE leve a questão ao Tribunal de Justiça da União Europeia.
A crise da zona euro apanhou a União Europeia mal equipada, desprevenida e desorientada. A arquitetura da moeda única estava incompleta e era incoerente, as contas de alguns estados-membro foram falsificadas com a cumplicidade de grandes bancos internacionais e a aquiescência dos seus parceiros europeus, Bancos faliram, contribuintes foram chamados a segurar os bancos, as dívidas soberanas explodiram e, sobretudo, perante a passividade dos “líderes” europeus e a resistência do governo da Alemanha, explodiram os seus juros. A reação, quando chegou, passou pela criação semi-improvisada de novos mecanismos — o Fundo Europeu de Estabilização Financeira — e organismos — a troika — que não estavam previstos pelos Tratados ou violavam os seus artigos. Só com o anúncio de que o Banco Central Europeu esta a disposto “a fazer tudo” para salvar o euro a fase aguda da crise passou. Mas os problemas estruturais persistem e, em alguns casos, até se agravaram. É normal que, em caso de crise, os bancos privados, que se costumam financiar junto dos Bancos Centrais à taxa de 1%, possam beneficiar de uma taxa de 0,01% mas que os estados, em caso de crise, pelo contrário, sejam obrigados a pagar taxas 600 e 800 vezes mais elevadas? Temos de acabar com estes “2 pesos e 2 medidas”. Bebendo inspiração naquilo que fez o Banco Central Americano para salvar o sistema financeiro, propomos que a “velha dívida” dos nossos estados possa ser refinanciada a taxas próximas de 0% pelo BCE. Bastou o simples facto de o BCE ter anunciado, durante o verão de 2012, ir fazer tudo o que fosse necessário para travar a crise da dívida pública para que os juros baixassem, demonstrando a urgência de fazer do BCE um genuíno prestamista de última instância. As dívidas dos estados-membro periféricos estão ainda mais altas, embora sejam agora detidas principalmente por instituições públicas europeias, e a 11 carga dessas dívidas não permite a esses países fazer a reconversão de que as suas economias necessitam. O passo racional é usar esta fase de aparente acalmia para encarar finalmente de forma séria a crise assimétrica que tem lavrado na União.
É tempo de organizar uma conferência europeia, incluindo os governos e os novos Parlamento e Comissão, para resolver os problemas interligados do excesso de dívida, crescimento económico anémico e falta de robustez institucional do euro. A ideia de um “Bretton woods” europeu foi lançada por Alexis Tsipras, líder do partido Syriza e candidato do Partido da Esquerda Europeia à presidência da Comissão Europeia. É uma boa ideia, que o LIVRE apoia, e que no Parlamento Europeu defenderemos como base de um acordo de apoio progressista à nova Comissão Europeia. Os elementos centrais de discussão nessa Conferência Económico-financeira Europeia poderiam passar por um alívio da dívida dos países periféricos — ou uma grande extensão dos seus prazos —, apoio ao lançamento de um “Projeto Ulisses” de recuperação das economias desses mesmos países e a criação de um Tesouro Europeu para complementar o Banco Central Europeu e que pudesse ter um efeito estabilizador em momentos de crise. É do interesse de longo prazo de todos os países obter um acordo baseado na sustentabilidade e complementaridade das várias economias da União Europeia.
A livre circulação de capitais tornou difícil cobrar impostos para lá de fronteiras. As multinacionais aproveitam-se disso — e alguns estados-membro também, ao facilitarem as condições para que empresas multibilionárias como a Google ou a Apple paguem menos de 1% de IVA na Irlanda, por exemplo. Não para de aumentar a tendência para a criação de empresas com enorme volume de negócios desterritorializado e uma pequena força de trabalho — e uma conta no fisco insultuosa para o cidadão comum. No entanto, estas empresas não podem ignorar o mercado europeu de 500 milhões de consumidores. Aqui está a nossa grande oportunidade.
O LIVRE defende que a União Europeia aproveite os instrumentos reguladores que já tem — na área dos mercados, da concorrência e das telecomunicações, entre outros — para servir de cobradora de impostos às multinacionais que operam em território europeu. Os estados-membro abster-se-iam de fazer competição fiscal entre si, mas em troca receberiam 99% do imposto cobrado. O restante 1% ficaria num fundo intergovernamental para ações conjuntas no domínio da ciência, da inovação e do emprego. As taxas poderiam ser determinadas de forma conjunta através de uma “cooperação reforçada” entre pelo menos 11 estados-membro, evitando assim o uso de um veto contra este mecanismo. Por não ser um imposto europeu, mas uma mera cobrança de impostos nacionais harmonizados voluntariamente e redistribuídos inteiramente aos estados-membro, este mecanismo é completamente compatível com os Tratados e permite mudar muito do que está errado na relação entre os cidadãos, os estados e os mercados, ao mesmo tempo que possibilita a limpeza dos défices dos orçamentos nacionais e o reinvestimento dos montantes cobrados em áreas de futuro. O LIVRE iniciará no Parlamento Europeu uma campanha a favor deste sistema, que incluirá em resoluções e num relatório de iniciativa parlamentar, e que culminará numa proposta de Iniciativa Legislativa Cidadã.
Os países periféricos, a que também chamaram PIIGS, não têm apenas um problema de financiamento nos mercados ou de controlo orçamental. Têm um problema subjacente, e muito mais importante, de inadequação das suas economias à realidade económica global. Esta tem, por um lado, sido moldada pelos interesses dos países centrais, grandes exportadores de tecnologia e outros produtos industriais complexos, ao contrário dos países periféricos: a Alemanha tirou partido da entrada da China na Organização Mundial do Comércio, ao passo que as exportações portuguesas, em boa medida mais básicas, foram esmagadas pelo colosso chinês. As medidas impostas pela troika e pelos governos europeus nestes países têm sido exatamente o contrário daquilo que eles precisam a longo prazo: não de cortes nos salários e incentivos à emigração, mas fixação de capital humano e um plano sustentado para a qualificação, especialização e diversificação das suas economias.
O LIVRE apoia a proposta de lançar para os países periféricos um “Projeto Ulisses”, baseado nos exemplos históricos da Tennessee Valley Authority e do Plano Marshall, que permita fazer o relançamento e a reconversão das suas economias. Um plano deste género tem de ter um calendário de médio prazo — sendo o ideal uma década — e deveria ser pilotado por uma agência integrada, que possa apoiar projetos em áreas muito diversas — da exportação de energias renováveis através das redes trans-europeias de energia até ao apoio à fixação de centros de investigação agrícola ou industrial — mas coordená-los regionalmente, e carrear os capitais do Banco Europeu de Investimento (BEI) necessários para os financiar. A União Europeia dispõe neste momento de agências que são maioritariamente especializadas, mas o processo de criação de uma agência integrada de desenvolvimento regional segue os mesmos trâmites da criação de qualquer agência europeia. Após o seu plano de recuperação, a “Agência Ulisses” poderia partir para outras paragens onde a sua ação transversal fosse necessária, das regiões suburbanas ou periurbanas às áreas fronteiriças ou de vizinhança da UE.
Uma característica da crise sistémica da zona euro foi o incremento de fluxos de capitais dos países que mais sofreram com a crise para os países com políticas tributárias e regimes empresariais mais frouxos. Em consequência, os países da crise foram privados de material tributável, o que resultou em pressões ainda maiores sobre a sua saúde orçamental. Tal concorrência fiscal, nomeadamente entre estados-membro da União, assemelha-se, em muitos aspetos, a uma corrida para o fundo que amplifica os efeitos da crise.
No Parlamento Europeu, o LIVRE promoverá a ideia de um pacto da União para eliminar esta concorrência fiscal entre estados-membro. Os benefícios são de três tipos: (i) remover um dos fatores que agravaram a crise e que podem contribuir para uma próxima crise, (ii) facilitar o caminho para a aproximação de todas as políticas fiscais, e (iii) dar um bom exemplo ao resto do mundo sobre as formas de abordar as questões dos paraísos fiscais e das jurisdições sigilosas. O sinal deve ser claro: os benefícios fiscais de um estado-membro não devem vir à custa de outro, e a UE deve recusar-se a dar qualquer endosso tácito aos regimes associados à lavagem de dinheiro.
De acordo com um relatório da EAPN — Rede Europeia Anti-Pobreza — são as “crianças o grupo mais vulnerável a situações de pobreza ou exclusão social. A taxa de risco de pobreza ou exclusão social para as crianças subiu em 2012 para 28.1% (UE28) (2010: 26.9%, UE28). Para Portugal e segundo a Eurostat a taxa de risco de pobreza para as crianças foi de 27.8%”. A pobreza infantil coloca em risco o desenvolvimento de toda uma sociedade. As crianças vítimas da pobreza têm, na maioria das vezes, baixos níveis de nutrição, ficando mais expostas a problemas de saúde, com fraco rendimento escolar, caindo muitas vezes num ciclo de exclusão social que pode tornar-se geracional. O crescente desemprego no espaço europeu tem feito aumentar consideravelmente os riscos de pobreza infantil, tendo em conta a total dependência das crianças relativamente ao rendimento dos pais e ainda a enorme diminuição dos apoios sociais às famílias.
O LIVRE considera prioritária a luta à pobreza infantil no espaço do Parlamento Europeu. Esta luta deverá focar-se prioritariamente na pressão para a criação e implementação de políticas de emprego dirigidas particularmente a famílias carenciadas, em especial famílias numerosas com rendimentos muito reduzidos, ou a famílias monoparentais. Dever-se-á ainda encorajar os estados-membro a adotarem medidas de reforço do orçamento das famílias mais atingidas e em claro perigo de pobreza extrema, como por exemplo, a subsidiação de habitação condigna. Um Plano Europeu contra a Pobreza Infantil é uma luta política que pode ser ganha, convencendo cada estado-membro a contribuir para um fundo comum que seria duplicado pelos fundos comunitários e assistido pelos projetos-piloto que podem ser financiados por decisão do Parlamento Europeu. Este Plano Europeu, cuja justificação moral e pública é inquestionável, poderia servir de exemplo para outras ações da União na mitigação dos efeitos da crise.
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) é uma peça essencial da construção europeia mas tem desempenhado um papel demasiado parcelar, para não dizer parcial. Por um lado esse papel deve-se à sua história: nascido numa comunidade económica, especializou-se num papel de garante do mercado; por outro lado, deve-se a quando o fazem trabalhar e porquê: neste momento só as instituições europeias, os estados-membro e as partes diretamente afetadas podem recorrer de forma imediata ao TJUE. Não é possível, ao contrário do que se passa noutros Supremos Tribunais do mundo, que classes de indivíduos possam recorrer coletivamente ao TJUE. Isto também ajuda a explicar porque houve tantos casos de regras de concorrência no TJUE, mas tão poucos baseados nas provisões mais fundamentais dos tratados ou na Carta Europeia dos Direitos Fundamentais. Vimos acima como a troika poderia ser levada a tribunal — desde que houvesse alguém para fazê-lo. É preciso finalmente dar passos para que o TJUE se transforme num garante dos cidadãos europeus.
O LIVRE defenderá em sede de revisão dos Tratados o direito de ação coletiva junto do TJUE. Este direito permitirá a categorias amplas de trabalhadores, consumidores ou moradores fazer valer os seus direitos e procurar compensação por danos sofridos. Mas o LIVRE defende também que um número mínimo de cidadãos de um estado-membro, ou de mais do que um estado-membro, possa levantar questões de âmbito “constitucional” no TJUE. Outra proposta do LIVRE levaria à implementação desses direitos em Portugal, mesmo sem mudança dos Tratados, a exemplo de alguns estados-membros, como a França, que têm já criados mecanismos automáticos para levar, através da sua administração, um caso apresentado coletivamente ou por entidades representativas dos cidadãos (sindicatos, associações de consumidores, etc.).
Entre os bens públicos, alguns são particularmente sujeitos à pressão mercantil, quer pela sua escassez, quer pelo crescimento populacional. É o caso da água potável, cuja partilha está condicionada por fatores geográficos, climáticos, perenes ou sazonais, que tenderão, cada vez mais, a repercutir consequências geopolíticas possivelmente mais graves do que as desencadeadas pela posse de recursos energéticos como o petróleo. A água potável é um bem essencial absolutamente imprescindível à vida humana, cuja provisão tem de estar permanentemente garantida a todos, de acordo com princípios de redistribuição cada vez mais rigorosos.
Para o LIVRE, é imperativo parar a mercantilização da água potável no espaço da UE. A água só deve ser paga, além de taxas razoáveis para a manutenção do serviço, no quadro de uma gestão pública, para penalizar consumos acima dos valores estimados por princípios de redistribuição deste bem. Só assim se poderá evitar a pressão para a sua privatização e a consequente limitação do seu acesso a quem a pode pagar, tornando-a objeto de contenda. Para o LIVRE, a UE deve condicionar a aceitação como parceiros económicos dos países cujas populações sofram de falta de acesso a água potável em virtude de processos de mercantilização deste bem.
67 medidas para mudar mesmo a União Europeia
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1. Derrotar a austeridade e o capitalismo desregulado
1.1. Levar ao Tribunal de Justiça da União Europeia a legalidade da troika e das suas decisões
A troika foi uma criação ad hoc dos governos dos estados-membro e é um bicho estranho. Duas partes da troika — a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu — são instituições da União e, como tal, estariam obrigadas a respeitar os Tratados e a Carta Europeia dos Direitos Fundamentais. Mas a ação da troika vai contra a letra e o espírito dos Tratados, em particular do artigo 3 do Tratado sobre a União Europeia, que estabelece como objetivos da União a solidariedade, a coesão e o pleno emprego. As violações da Carta foram também já objeto de análise jurídica convincente. Um relatório do Parlamento Europeu comprovou que a troika violou até o seu próprio mandato ao chantagear os governos dos estados-membro sob programa e ao arrogar-se de poderes de decisão que não lhe tinham sido atribuídos. O estabelecimento, ação e medidas da troika foram das mais escandalosas violações do acervo da União, e estas violações não foram ainda levadas ao Tribunal de Justiça da União Europeia porque apenas os governos dos estados-membro poderiam fazer a queixa.
O LIVRE está decidido a pôr fim a esta passividade. Mesmo um país endividado que tenha pedido soberanamente um programa de apoio não pode ser sujeito a um tratamento ilegal. 1) Qualquer governo português apoiado pelo LIVRE, ou no qual o LIVRE participe, deve explorar a via processual junto do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e obter compensação pela aplicação de medidas da troika que vão contra o acervo comunitário ou os Tratados da União. 2) Em alternativa, um caso submetido aos tribunais portugueses pode dar origem a uma questão pré-judicial ao TJUE, recurso jurídico que permitirá esclarecer definitivamente os pontos de direito e estabelecer a base para futuras compensações pelos danos causados. 3) Em coordenação com os outros países sob programa, esta estratégia poderá levar a uma negociação política com as instituições europeias e os restantes estados-membro para obter essas compensações através de um programa de recuperação e reconversão da economia nacional (ver abaixo). 4) A partir do Parlamento Europeu, o LIVRE participará nos passos subsequentes à investigação da troika propondo que o próprio PE leve a questão ao Tribunal de Justiça da União Europeia.
1.2. Revogar o Tratado Orçamental
Como a troika, o Tratado Orçamental foi gerado pela obsessão da austeridade. Trata-se de um Tratado Intergovernamental, realizado fora dos Tratados da União Europeia, inútil para deter o pânico nos mercados. Com as suas disposições contra a despesa pública, o Tratado Orçamental restringe significativamente as opções de política orçamental dos governos e parlamentos nacionais, proibindo-os de fazer exatamente aquilo que deve ser feito em período de contração económica — investir para impedir uma espiral recessiva e sair do buraco – e reduzindo as eleições a uma mera formalidade. Esta “ilegalização do keynesianismo” foi inútil no seu objetivo anunciado — o fator estabilizador acabou por vir do anúncio de Mario Draghi de que o BCE “faria tudo o que fosse necessário” para salvar o euro — e põe em risco o próprio projeto europeu, ao condicionar os tratados e instituições da União, laboriosamente construídos durante gerações, aos ditames de um tratado escrito durante uma madrugada e cego às necessidades da população europeia.
Os próximos anos são decisivos para eliminar esta monstruosidade: até 1 de janeiro de 2018, segundo as suas provisões, o Tratado deverá estar integrado no acervo comunitário. O significado desta data é claro: uma maioria de direita no Parlamento e na Comissão durante o próximo mandato significa austeridade para sempre. Para impedir esse enquistamento dos Tratados da União pelo Tratado Orçamental, é fundamental que haja uma maioria de frente progressista no Parlamento Europeu e uma Comissão apoiada por essa maioria em Bruxelas, que permita ao Tratado Orçamental morrer de morte natural a 1 janeiro de 2018 — ou, se possível, ainda antes disso. Caso esteja representado no Parlamento Europeu, o LIVRE fará parte de todos os esforços para que cesse a participação das instituições comunitárias em programas de austeridade, revogando o sistema de vigilância orçamental (six-pack) que instituiu a vigilância austeritária sobre os governos nacionais, e reforçando todas as possibilidades de escrutínio democrático e veto parlamentar sobre estes programas, enquanto eles durarem. O apoio do LIVRE a uma Comissão Europeia presidida por um dos candidatos progressistas estará sempre dependente da implementação de uma agenda de investimento e emprego e da inversão de rumo em relação à política imposta pelo Tratado Orçamental à UE e aos seus estados-membro.
1.3. Convocar a conferência económico-financeira de que a União precisa
A crise da zona euro apanhou a União Europeia mal equipada, desprevenida e desorientada. A arquitetura da moeda única estava incompleta e era incoerente, as contas de alguns estados-membro foram falsificadas com a cumplicidade de grandes bancos internacionais e a aquiescência dos seus parceiros europeus, Bancos faliram, contribuintes foram chamados a segurar os bancos, as dívidas soberanas explodiram e, sobretudo, perante a passividade dos “líderes” europeus e a resistência do governo da Alemanha, explodiram os seus juros. A reação, quando chegou, passou pela criação semi-improvisada de novos mecanismos — o Fundo Europeu de Estabilização Financeira — e organismos — a troika — que não estavam previstos pelos Tratados ou violavam os seus artigos. Só com o anúncio de que o Banco Central Europeu estava disposto “a fazer tudo” para salvar o euro a fase aguda da crise passou. Mas os problemas estruturais persistem e, em alguns casos, até se agravaram. É normal que, em caso de crise, os bancos privados, que se costumam financiar junto dos Bancos Centrais à taxa de 1%, possam beneficiar de uma taxa de 0,01% mas que os estados, em caso de crise, pelo contrário, sejam obrigados a pagar taxas 600 e 800 vezes mais elevadas? Temos de acabar com estes “2 pesos e 2 medidas”. Bebendo inspiração naquilo que fez o Banco Central Americano para salvar o sistema financeiro, propomos que a “velha dívida” dos nossos estados possa ser refinanciada a taxas próximas de 0% pelo BCE. Bastou o simples facto de o BCE ter anunciado, durante o verão de 2012, ir fazer tudo o que fosse necessário para travar a crise da dívida pública para que os juros baixassem, demonstrando a urgência de fazer do BCE um genuíno prestamista de última instância. As dívidas dos estados-membro periféricos estão ainda mais altas, embora sejam agora detidas principalmente por instituições públicas europeias, e a carga dessas dívidas não permite a esses países fazer a reconversão de que as suas economias necessitam. O passo racional é usar esta fase de aparente acalmia para encarar finalmente de forma séria a crise assimétrica que tem lavrado na União.
É tempo de organizar uma conferência europeia, incluindo os governos e os novos Parlamento e Comissão, para resolver os problemas interligados do excesso de dívida, crescimento económico anémico e falta de robustez institucional do euro. A ideia de um “Bretton woods” europeu foi lançada por Alexis Tsipras, líder do partido Syriza e candidato do Partido da Esquerda Europeia à presidência da Comissão Europeia. É uma boa ideia, que o LIVRE apoia, e que no Parlamento Europeu defenderemos como base de um acordo de apoio progressista à nova Comissão Europeia. Os elementos centrais de discussão nessa Conferência Económico-financeira Europeia poderiam passar por um alívio da dívida dos países periféricos — ou uma grande extensão dos seus prazos —, apoio ao lançamento de um “Projeto Ulisses” de recuperação das economias desses mesmos países e a criação de um Tesouro Europeu para complementar o Banco Central Europeu e que pudesse ter um efeito estabilizador em momentos de crise. É do interesse de longo prazo de todos os países obter um acordo baseado na sustentabilidade e complementaridade das várias economias da União Europeia.
1.4. Crescer e criar emprego: um novo mandato para o Banco Central Europeu
Ao contrário dos bancos centrais das outras grandes divisas do mundo, o Banco Central Europeu tem um mandato, à primeira vista, limitado. Os governos da União deram-lhe instruções para controlar a inflação e manter a estabilidade de preços, mas sem ordens específicas para combater o desemprego ou estimular o crescimento por via monetária. Este mandato pela metade tornou-se numa pílula envenenada quando a crise começou e é hoje evidente que o Banco Central Europeu tem de ter uma ação mais ampla.
Os adversários do progresso social e económico têm tentado argumentar que, para reformar o mandato do Banco Central Europeu, será preciso mudar os Tratados — e em sede de revisão dos Tratados, o LIVRE no Parlamento Europeu defenderia certamente a inclusão do pleno emprego e do crescimento económico entre os objectivos primordiais do Banco Central Europeu. Mas é possível fazer muito mais, e fazê-lo já. Com os Tratados atuais, o BCE deve já trabalhar para atingir os “objetivos económicos da União” (desde que sem prejuízo do controle da inflação) e entre estes contam-se o pleno emprego, a coesão, a solidariedade e um alto nível de desenvolvimento económico. A realização destes objetivos tem sido bloqueada por uma Comissão Europeia passiva e um Conselho francamente reacionário. No Parlamento Europeu, reforçando a base política para uma mudança progressista na União, o LIVRE lembrará ao BCE as obrigações que já tem de promover o emprego e o crescimento económico e denunciará quaisquer tentativas de bloqueio destes objetivos em Berlim, Bruxelas e Frankfurt. Em todas as propostas legislativas relevantes, o LIVRE incluirá como base legal o artigo 3º do TUE e os seus objetivos de pleno emprego e citará a obrigação por parte do BCE de respeitar esses objetivos na sua ação, de acordo com o artigo 282º do TFUE.
1.5. Criar uma genuína União Bancária europeia
O LIVRE apoia a constituição de uma União Bancária no espaço Europeu que quebre o ciclo vicioso entre os bancos e os estados, mas não aceita o atual acordo sobre a União Bancária. Este acordo não torna possível a resolução rápida dos problemas da banca porque continua sem existir uma instituição capaz de encerrar um banco em dificuldades. O princípio da solidariedade europeia também não é aplicado neste acordo para a banca, dado que o fundo a que os bancos poderão recorrer em caso de falência é apenas uma mera justaposição dos fundos nacionais, financiados por cada país participante, e não um fundo europeu tal como Bruxelas e o LIVRE defendem. Da mesma forma que a utilização do mecanismo de socorro só é possível através dos empréstimos que os governos farão aos bancos, assumindo a responsabilidade pelo reembolso e pelos juros, o que agravará a dívida pública dos países.
O LIVRE propõe que os bancos possam recorrer a um fundo de emergência financiado por fundos europeus, no qual as decisões sejam tomadas por um conselho de resolução em plenário formado por peritos independentes supervisionados pelo Parlamento e pelo Conselho, e não exclusivamente pelos Ministros das Finanças, tal como propõe o atual acordo. O LIVRE não aprova esta contaminação entre estados e banca, em que, por um lado, a dívida dos bancos torna os estados mais frágeis e, por outro, os estados afundam os bancos impondo-lhes a compra dos seus títulos de dívida, o que é precisamente o que os defensores de uma união bancária europeia deveriam querer evitar.
1.6. Emitir eurobonds e outros títulos da dívida à escala europeia
O euro é uma moeda unicamente disfuncional no mundo, na medida em que não tem um instrumento de dívida à mesma escala da emissão da moeda. Nunca na história tal situação foi sustentável (após a independência dos Estados Unidos da América, dez anos bastaram para que o novo país percebesse que o dólar não seria sustentável sem emissão de Títulos do Tesouro americano). A União Europeia, ou pelo menos a zona euro, precisa de poder emitir títulos de dívida de pelo menos dois tipos diferentes: de estabilidade e de investimento.
O LIVRE é favorável à emissão de dívida da União, com caráter supletivo às dívidas dos estados-membro, e proporá medidas nesse sentido no Parlamento Europeu. Em primeiro lugar, os eurobills ou stability bonds, que foram derrotados por curta margem no atual Parlamento Europeu, assegurariam a preservação da moeda da União e diminuiriam os choques sobre os juros das dívidas soberanas dos estados-membro. Em segundo lugar, o LIVRE defende a introdução de eurobonds, que permitiriam financiar grandes projetos de relançamento da economia e que poderiam ser emitidos através da cooperação reforçada entre pelo menos onze países da União. É possível assim contornar as objeções da Alemanha à emissão de eurobonds e recolher os recursos necessários para o financiamento, por exemplo, de um “projeto Ulisses” de recuperação das economias dos países periféricos. No quadro de uma estratégia conjunta de países da União, mesmo sem a Alemanha, pode ser solicitada à Comissão Europeia uma proposta de cooperação reforçada para emissão de eurobonds, como recomendado já em resolução do Comité Económico e Social Europeu. O LIVRE no Parlamento Europeu tomará a iniciativa de emendar legislação para que a emissão de eurobonds seja uma realidade.
1.7. Dar capacidade orçamental à UE a partir da zona euro
Até ao presente, a função executiva da UE não tem capacidade orçamental. Em particular, a UE não tem o poder de decidir utilizar instrumentos de dívida para reunir receitas que poderiam ser utilizadas a favor dos objetivos da União, incluindo a coesão, o pleno emprego e a solidariedade entre estados-membro. O único meio de financiamento vem dos estados-membro e está limitado pelo quadro financeiro plurianual. Tal arquitetura impõe restrições rígidas sobre as iniciativas políticas / legislativas que venham a ser adotadas, devido a uma eventual escassez de financiamento. Além disso, a União não tem meios para lidar com a mudança de circunstâncias. O problema é mais evidente no contexto da área do euro, onde existe uma assimetria entre a função monetária unificada e o ambiente fiscal compartimentado. Isso cria atritos contrários aos objetivos económicos da União Europeia.
O LIVRE defende que, através de uma mudança dos Tratados, a União deveria ter recursos próprios para poder levar a cabo as suas políticas sem ter de depender das transferências financeiras dos estados-membro. Estes recursos próprios podem provir de taxas sobre o roaming, a poluição ou as transações financeiras, e resultariam na formação e reconhecimento do primeiro orçamento genuíno da UE. O limite máximo pode ser ajustado por relação com os orçamentos nacionais, e poderiam ser introduzidas disposições específicas para resolver de forma adequada as particularidades de uma tal ordem orçamental em dois níveis. A União ganharia os meios necessários de obtenção de receitas e teria os dispositivos necessários para emitir os seus próprios instrumentos de dívida para financiar os seus projetos. Tal como acontece com a criação do euro, este esquema poderia ser estabelecido entre um número reduzido de estados-membro, e é na própria zona euro, que é já uma união monetária sem uma união fiscal, que há já a maior urgência para começar a construir uma robusta capacidade orçamental.
1.8. Apertar a supervisão dos fundos de investimento e do sistema bancário sombra
A Grande Recessão foi em grande medida causada por operações frívolas dos atores de mercado no sistema bancário sombra ou “sistema bancário paralelo”, ou seja, o setor desregulado do mercado em que certas entidades que não são oficialmente reconhecidas e regulamentadas como “bancos” conseguem desempenhar o papel de um banco comercial típico na intermediação e criação de crédito. Os “hedge funds” são os principais elementos do sistema bancário paralelo, entre os quais se contam também os instrumentos financeiros derivados e outros instrumentos ou produtos financeiros não registados ou regulamentados pelos estados. As regulações europeias e nacionais não têm acompanhado a evolução das finanças e não deram suficiente importância ao sistema bancário sombra como catalisador nas operações dos mercados financeiros. Também os “hedge funds” tendem a operar sob uma supervisão regulamentar mínima e insuficiente. Contudo, a crise mostrou claramente que estes agentes financeiros não vigiados podem contribuir para distorções em grande escala e causar danos que podem reverberar por toda a economia.
O LIVRE defende que a UE deve atualizar o seu sistema de regulação financeira, ampliando o âmbito da legislação para: (i) cobrir todas as atividades conhecidas de banca paralela, (ii) oferecer às autoridades de supervisão mais poderes para lidarem em conformidade com novos produtos financeiros, (iii) fortalecer, quando necessário, o mandato de todas as autoridades de supervisão de forma a que possam impor sanções, definir índices de alavancagem, introduzir requisitos de capital adicionais e, em geral, adotar qualquer outra medida micro-prudencial necessária para garantir a estabilidade do sistema financeiro.
1.9. Promover a imposição de uma taxa sobre as transações financeiras nos mercados derivados
Os derivados são instrumentos financeiros baseados numa relação contratual estabelecida entre duas ou mais partes, onde todas as condições são previamente estabelecidas. Os bancos de investimento podem criar produtos derivados através de simples acordos, o que torna o mercado dos derivados muito apelativo.
O LIVRE apoia a proposta de diretiva comunitária que aplica uma cooperação reforçada no domínio do imposto sobre as transações financeiras, visando tributar operações como as acções de sociedades, as obrigações, os instrumentos do mercado monetário, as ações de fundos de investimento, os produtos estruturados e derivados e a celebração ou alteração de contratos de derivados, na condição de que, pelo menos, uma parte da transação seja estabelecida num estado-membro. A referida diretiva prevê ainda que parte das receitas geradas pela taxa sobre as transações financeiras – entre 30 e 35 milhões de euros por ano, de acordo com estimativas da Comissão Europeia – seja utilizada como recurso próprio do orçamento da UE, reduzindo a contribuição baseada no Rendimento Nacional Bruto proveniente dos estados-membro. Este reforço da componente de recursos próprios permitirá fortalecer o orçamento da UE, que atualmente corresponde apenas a 1% do PIB da União. Ao mesmo tempo, ele garante também uma maior autonomia de Bruxelas em relação aos estados-membro (com uma maior contribuição líquida, particularmente a Alemanha) na definição de programas de relançamento da economia e na persecução de objetivos de coesão económica, social e territorial. O LIVRE apela à aplicação imediata da taxa de 0,1% sobre as transacções financeiras, embora salvaguarde que esta taxa possa ir até aos 0,2%. É fundamental que os mercados contribuam com a sua parte para o pagamento das suas próprias crises e dos seus desvarios.
1.10. Harmonizar a base de coleta fiscal empresarial
No Mercado Único, taxas fiscais únicas deveriam ser a regra, mas não são. As diferentes taxas gerais, como o IVA cujo valor é diferente de país para país, e as taxas menores tornam o mapa europeu da coleta fiscal confuso, impercetível e alvo de fugas de impostos dos mercados nacionais para outro país membro da UE. Esta situação, por um lado, leva a que a fuga de impostos dos mercados nacionais seja legal e, por outro, dificulta muito a vida das empresas exportadoras e importadoras e complica enormemente a vida dos cidadãos emigrantes.
Por isso, o LIVRE defende a harmonização fiscal empresarial dentro do espaço europeu como uma prioridade, tanto nas taxas gerais (IVA, IRC e outras) como nas taxas menores (imposto sobre o álcool, etc), permitindo um mercado único livre, abrangente e igualitário entre todos os estados-membro.
1.11. Tributar as multinacionais através da União
A livre circulação de capitais tornou difícil cobrar impostos para lá de fronteiras. As multinacionais aproveitam-se disso — e alguns estados-membro também, ao facilitarem as condições para que empresas multibilionárias como a Google ou a Apple paguem menos de 1% de IVA na Irlanda, por exemplo. Não para de aumentar a tendência para a criação de empresas com enorme volume de negócios desterritorializado e uma pequena força de trabalho — e uma conta no fisco insultuosa para o cidadão comum. No entanto, estas empresas não podem ignorar o mercado europeu de 500 milhões de consumidores. Aqui está a nossa grande oportunidade.
O LIVRE defende que a União Europeia aproveite os instrumentos reguladores que já tem — na área dos mercados, da concorrência e das telecomunicações, entre outros — para servir de cobradora de impostos às multinacionais que operam em território europeu. Os estados-membro abster-se-iam de fazer competição fiscal entre si, mas em troca receberiam 99% do imposto cobrado. O restante 1% ficaria num fundo intergovernamental para ações conjuntas no domínio da ciência, da inovação e do emprego. As taxas poderiam ser determinadas de forma conjunta através de uma “cooperação reforçada” entre pelo menos 11 estados-membro, evitando assim o uso de um veto contra este mecanismo. Por não ser um imposto europeu, mas uma mera cobrança de impostos nacionais harmonizados voluntariamente e redistribuídos inteiramente aos estados-membro, este mecanismo é completamente compatível com os Tratados e permite mudar muito do que está errado na relação entre os cidadãos, os estados e os mercados, ao mesmo tempo que possibilita a limpeza dos défices dos orçamentos nacionais e o reinvestimento dos montantes cobrados em áreas de futuro. O LIVRE iniciará no Parlamento Europeu uma campanha a favor deste sistema, que incluirá em resoluções e num relatório de iniciativa parlamentar, e que culminará numa proposta de Iniciativa Legislativa Cidadã.
1.12. Reestruturar o sistema bancário
O resgate ao sistema bancário já custou aos contribuintes europeus mais de 428 biliões de euros e, no entanto, as instituições bancárias não se tornaram mais eficientes, não emprestaram dinheiro para as pequenas empresas nem injetaram o capital recebido na economia real. É por isso urgente que os contribuintes europeus não paguem nem mais um cêntimo para o resgate dos bancos. É ainda mais urgente que se reestruture o sistema bancário. A falta de regulação bancária, que deixou que a busca do lucro ultrapassasse a natureza do bem público da função monetária, levou à crise das dívidas soberanas onde hoje nos encontramos. É por isso necessário que as atividades bancárias estejam fortemente reguladas, com a aplicação de medidas gerais como introdução de valores quantitativos de controlo de crédito, a introdução dos tetos de taxa de juros dos depósitos e a introdução de limites às atividades das instituições financeiras, sobretudo pela separação entre os bancos comerciais e de investimento. E é preciso começar já intervindo e denunciando, desde logo, as vendas associadas.
O LIVRE defende o fim das vendas associadas em caso de renegociação do spread: é frequente a instituição de crédito apresentar um spread base para o contrato que pode ser reduzido com a aquisição pelo cliente bancário de outros produtos e serviços bancários, embora não deva, ou seja, não é vinculativo, propor a aquisição de produtos que envolvam risco de capital. Na nossa perspetiva, a instituição deveria estar proibida por lei de propor a aquisição de produtos de alto risco, assim como determinar a negociação do spread pelas vendas associadas. A base da negociação deve ser o risco do cliente que, se apresentar menos risco, deve usufruir de um spread menor. Ao propor as vendas associadas, a instituição bancária está a substituir apenas um crédito por outro, o que não nos parece legal, nem ético. Os salários dos administradores dos bancos, executivos e não executivos, devem ser aprovados pelo BCE, definindo-se um salário máximo para bancos intervencionados. Em caso de falência de um banco, prejuízos ou intervenção do estado, os administradores, acionistas e restantes funcionários do banco não têm direito a receber bónus. Por outro lado, os bancos onde a esmagadora maioria das pessoas deposita hoje o seu dinheiro são os mesmos que correm riscos na especulação financeira desenfreada. Não foi sempre assim, e não tem que ser assim no futuro. Separar a banca onde as pessoas comuns depositam os rendimentos das suas vidas e contraem empréstimos, da banca que joga no mercado financeiro reduziria o risco que os depositantes correm – e também dificultaria a existência de bancos grandes demais, que os estados são forçados a resgatar.
1.13. Colocar o Mecanismo Europeu de Estabilidade sob a legislação da UE
O Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) é o fundo europeu projetado para fornecer o apoio financeiro a qualquer mecanismo permanente de resolução de crises para os países da área do euro. Este mecanismo emite instrumentos de dívida para financiar empréstimos e outras formas de assistência financeira a estados-membro. No presente, a sua base jurídica é um tratado inter-governamental entre os estados-membro da zona do euro . A principal falha de tal configuração pode prejudicar o controlo do Parlamento Europeu, que não tem qualquer poder real sobre a conduta do mecanismo. Além disso, a natureza inter-governamental concede direitos de veto a todos e cada um dos estados-membro, prejudicando assim a eficácia do mecanismo e, potencialmente, mantendo-o refém de interesses políticos nacionais.
O Mecanismo Europeu de Estabilidade deve ser colocado sob a jurisdição da UE, seja por mudança dos Tratados ou através de legislação secundária. Entre os objetivos desta transição contam-se: (i) garantir a plena conformidade com o acervo da União, (ii) reforçar o papel do Parlamento Europeu, reforçando, assim, a responsabilidade democrática do MEE, (iii) emancipar o MEE de qualquer hipótese de veto espúrio, o que reforçará a sua independência operacional, (iv) agilizar a sua capacidade de agir de forma oportuna e decisiva no combate a qualquer fator de instabilidade económica, e (v) desenvolver à escala da União uma alternativa credível e responsável ao FMI.
1.14. Desenhar o mecanismo para maior justiça na gestão das dívidas soberanas
Algo está profundamente errado quando as mesmas dívidas soberanas que votam, na sua grande maioria, populações a uma condição precária e de empobrecimento, proporcionam os maiores retornos aos investidores. Em janeiro deste ano, a rendibilidade dos títulos de dívida portuguesa com maturidade acima dos 7 anos superava os 9%, ao passo que a rendibilidade dos títulos com maturidade acima de 1 ano superava os 6,5%. Este enriquecimento de investidores à custa do empobrecimento forçado de uma sociedade faz paralelo com outra iniquidade social: o pagamento de juros de dívida a troco do desmantelamento de pilares da coesão de uma sociedade, seja o estado social sejam direitos sociais. Se aliarmos a estas iniquidades a impagabilidade da dívida, tornada assim fonte perpétua de juros, podemos concluir que as dívidas soberanas podem ser, para as economias mais frágeis da União (especialmente da zona euro), instrumentos de dominação social e de extração de riqueza.
O LIVRE considera que as partes da dívida detidas pelo Banco Central Europeu e pela Comissão Europeia deverão ser anuladas para dessa forma induzir o arranque das economias nacionais sob programas de ajustamento. Justifica-se esta anulação da dívida pelos benefícios para o projeto europeu na sua globalidade, seja de uma perspetiva económica seja de uma perspetiva social.
1.15. Tirar o oxigénio aos paraísos fiscais e recuperar o nosso dinheiro
Na União Europeia perdem-se aproximadamente 850 mil milhões de euros por ano em evasão fiscal, a que se deve acrescentar 150 mil milhões de euros por ano em planeamento fiscal agressivo. Isto equivale a um montante total de 1 bilião de euros por ano. Só em Portugal está estimado que a perda em receitas fiscais correspondeu a 78,2% do défice orçamental de 2010, que foi de 15,8 mil milhões de euros. Por outras palavras, cerca de 80% do défice orçamental equivale à perda de receita em sonegação e evasão fiscal. Se esse montante tivesse sido canalizado para os cofres do estado, a necessidade de um resgate da troika teria sido muito menos urgente e as condições muito melhores. Boa parte da fuga ao fisco passa por paraísos fiscais, dentro ou fora da União. Os bancos justificam-se com estas “jurisdições de segredo” para não fornecer às autoridades fiscais dados sobre os ativos que têm depositados em offshores. Mesmo que não seja possível erradicar estes dispositivos sem um acordo global, a União Europeia tem o dever de liderar o processo, de dar o exemplo e de criar dispositivos de certificação que inibam agentes económicos que sigam práticas pouco transparentes de operar no seu interior.
Se não pudermos acabar com os paraísos fiscais, podemos pelo menos acabar com o segredo dos bancos europeus que neles operam — e que é o oxigénio da sua atividade. Os EUA fizeram-no com a sua lei FATCA, que obriga os seus bancos a darem toda a informação sobre o que fazem as suas filiais fora de fronteiras. No quadro da união bancária, a União Europeia pode ir até mais longe: banco que não divulgar o que faz nos paraísos fiscais não pode fazer negócio ou não tem acesso a crédito do BCE. Na sequência das propostas da comissão CRIM do Parlamento Europeu, o LIVRE fará propostas de emenda a toda a legislação que permita exigir transparência total às instituições financeiras no fornecimento de todas as informações sobre as suas atividades junto de autoridades de supervisão offshore. A este respeito as instituições financeiras devem ser desencorajadas ou, se necessário, proibidas de operar em territórios que constem das listas negras elaboradas pelas Nações Unidas, pela OCDE ou pela iniciativa StAR do Banco Mundial. Os bancos europeus devem garantir que todas as suas subsidiárias mundiais estejam em conformidade com a directiva da UE sobre o combate à lavagem de dinheiro (diretiva AML).
2. Obter um alto nível de desenvolvimento social, económico e ambiental
2.1. Lançar uma Agência de Recuperação Económica para os países Ulisses
Os países periféricos, a que também chamaram PIIGS, não têm apenas um problema de financiamento nos mercados ou de controlo orçamental. Têm um problema subjacente, e muito mais importante, de inadequação das suas economias à realidade económica global. Esta tem, por um lado, sido moldada pelos interesses dos países centrais, grandes exportadores de tecnologia e outros produtos industriais complexos, ao contrário dos países periféricos: a Alemanha tirou partido da entrada da China na Organização Mundial do Comércio, ao passo que as exportações portuguesas, em boa medida mais básicas, foram esmagadas pelo colosso chinês. As medidas impostas pela troika e pelos governos europeus nestes países têm sido exatamente o contrário daquilo que eles precisam a longo prazo: não de cortes nos salários e incentivos à emigração, mas fixação de capital humano e um plano sustentado para a qualificação, especialização e diversificação das suas economias.
O LIVRE apoia a proposta de lançar para os países periféricos um “Projeto Ulisses”, baseado nos exemplos históricos da Tennessee Valley Authority e do Plano Marshall, que permita fazer o relançamento e a reconversão das suas economias. Um plano deste género tem de ter um calendário de médio prazo — sendo o ideal uma década — e deveria ser pilotado por uma agência integrada, que possa apoiar projetos em áreas muito diversas — da exportação de energias renováveis através das redes trans-europeias de energia até ao apoio à fixação de centros de investigação agrícola ou industrial — mas coordená-los regionalmente, e carrear os capitais do Banco Europeu de Investimento (BEI) necessários para os financiar. A União Europeia dispõe neste momento de agências que são maioritariamente especializadas, mas o processo de criação de uma agência integrada de desenvolvimento regional segue os mesmos trâmites da criação de qualquer agência europeia. Após o seu plano de recuperação, a “Agência Ulisses” poderia partir para outras paragens onde a sua ação transversal fosse necessária, das regiões suburbanas ou periurbanas às áreas fronteiriças ou de vizinhança da UE.
2.2. Rejeitar o Tratado de Comércio Transatlântico
Um Tratado de Comércio Transtlântico (Transatlantic Trade and Investment Partnership – TTIP) está atualmente a ser negociado entre a UE e os EUA. Este Tratado, segundo a Comissão Europeia, serviria para “eliminar as barreiras comerciais em diversos setores, de modo a facilitar a compra e venda de bens e serviços entre os EUA e a UE.” Os direitos aduaneiros seriam eliminados e haveria uma harmonização de regulamentos técnicos, normas e procedimentos de aprovação. Apesar do impacto que um tratado deste género teria, pouca ou nenhuma informação tem chegado à opinião pública. Entre outras, este Tratado incluiria uma cláusula sobre a disputa empresa-estado, de modo a garantir a proteção de investidores estrangeiros perante os governos. Na prática, esta cláusula permitiria que as empresas processassem os estados caso não concordassem com as leis ou decisões locais. Exemplos de situações destas em outros Tratados de livre-comércio não faltam, desde processos à Austrália por parte de uma grande tabaqueira até ao processo por parte de uma indústria mineira canadiana, alegando perda de lucros futuros, ao estado de El Salvador, por este ter impedido uma exploração que iria contaminar os recursos hídricos do país. De acordo com algumas fugas de informação, este acordo é especialmente pesado em questões de patentes e propriedade intelectual, onde tentará reintroduzir algumas das provisões rejeitadas pelo Parlamento Europeu no acordo ACTA, e passa o habitual rolo compressor pelas regulações do mercado de trabalho e de serviços ou pelas bitolas de proteção ambiental e de segurança alimentar.
O LIVRE, como partido que defende a inclusão dos cidadãos em todos os processos de decisão, opõe-se ao modo como o Tratado de Comércio Transatlântico está a ser negociado. Os cidadãos devem ser ouvidos e informados sobre o impacto que este tratado terá nas suas vidas. Mais do que isso: o LIVRE está claramente contra este tratado que permitiria às empresas desrespeitar as leis ambientais, sociais e de saúde pública legitimamente impostas pelos estados. As grandes empresas não podem fazer dos estados europeus seus reféns, ameaçando constantemente com processos jurídicos que possam fazer com que algumas leis mais progressistas não sejam aplicadas. O momento de agir é agora, informando os cidadãos e fazendo oposição ao tratado a nível europeu. O Parlamento Europeu terá de aceitar ou rejeitar este tratado já nos próximos meses: é essencial eleger um máximo de deputados para o PE que defendam os trabalhadores, os consumidores e o ambiente contra esta nova tentativa de impor uma agenda neoliberal em ambos os lados do Atlântico.
2.3. Expandir direitos: acordos coletivos de trabalho para multinacionais europeias
Um exemplo: algumas empresas de contact center, oriundas de países como França ou a Alemanha, usufruem em Portugal (como na Polónia ou na Tunísia) de mão-de-obra qualificada com muito baixos salários, por vezes menos de metade do valor que praticam na empresa mãe. A estes trabalhadores são impostas exigências de língua materna e de cumprimentos de horários iguais ao do país sede, sem ter em conta a diferença horária e a adequação aos meios de transporte existentes, dado que o trabalho é prestado para clientes que estão no país de origem e em tempo real.
Este é um exemplo claro de como ao aumento de escala dos nossos mercados deveria ter correspondido o estabelecimento de diálogo social ao mesmo nível. Os sindicatos europeus devem ter, no seu confronto com as multinacionais, acesso à mesma ferramenta básica que têm a nível nacional: a negociação coletiva. O LIVRE, no Parlamento Europeu, lutará por esse reforço elementar dos direitos dos trabalhadores, usando como base legal a Carta dos Direitos Fundamentais e os artigos do Tratado de Funcionamento da União Europeia que mencionam a necessidade de diálogo e concertação social ao nível europeu. Em simultâneo, a competência da União Europeia nas questões do mercado comum permitiria que uma simples diretiva ordenasse a equivalência entre as condições de trabalho existentes nos países sede de multinacionais, dentro da União Europeia, e as condições de trabalho nas mesmas empresas nos países em que se implementam, permitindo aos sindicatos recorrer à via judicial quando esta equivalência não se verificasse.
2.4. Proibir os estágios não remunerados na União
Um estágio deveria ser entendido como uma oportunidade educativa no âmbito profissional, num período limitado, e não como uma forma de exploração de trabalho barato, intensivo e prolongado. Infelizmente, a prática de usar e abusar do trabalho de estagiários tem-se tornado cada vez mais frequente com a crise e a destruição dos direitos laborais. Todos perdemos com este estado de coisas: os estagiários que são explorados, os trabalhadores que perdem o emprego, as famílias que continuam a apoiar financeiramente os seus jovens (2/3 dos estagiários dependem do apoio dos pais).
Uma simples diretiva ou regulamento proposto pela Comissão — ou uma simples emenda do LIVRE em diretivas ou regulamentos nesta área — pode determinar que os estágios devam ser pagos e regulados, desde que aprovada pelo Parlamento e pelo Conselho. No mínimo, provisões sobre obrigatoriedade de informação no mercado devem obrigar as empresas e instituições, públicas ou privadas, a fornecer dados completos e transparentes sobre as situações dos seus estagiários, e os tribunais nacionais e europeus poderão agir em caso de incumprimento destas medidas. As próprias instituições europeias — incluindo o Parlamento Europeu — devem eliminar absolutamente os estágios não remunerados no seu seio. O LIVRE apresentará ações junto do Colégio de Questores do Parlamento Europeu para acabar com esta prática e exigirá à Comissão Europeia a realização de estudos e estatísticas sobre o fenómeno dos estágios não remunerados nas instituições europeias, o lançamento de uma campanha de informação e o estabelecimento de uma rede de queixas anónimas ligadas diretamente ao gabinete da Provedora do Cidadão Europeu.
2.5. Relançar uma verdadeira Garantia Jovem para o Emprego e a Formação
Na UE há 5,7 milhões de jovens desempregados e 1,5 milhões de jovens que não têm outra alternativa além de aceitar empregos precários. Por outras palavras, um em cada dois jovens não consegue arranjar emprego. A Garantia Jovem, recomendada pela Comissão aos estados-membro, deve ser tornada obrigatória. Contudo, a sustentabilidade deste sistema só será garantida se lhe forem atribuídos mais fundos e se a sua implementação pelos estados-membro for monitorizada e avaliada anualmente.
No Parlamento Europeu, o LIVRE proporá que a Garantia Jovem passe a ser determinada por uma diretiva e alvo de um fundo reforçado. Utilizaremos como base legal o artigo 149º, que estabelece que “o Parlamento Europeu e o Conselho podem adotar incentivos para apoiar ações no campo do emprego, em particular através do recurso a projetos-piloto” para propormos uma cooperação reforçada que combata a fuga de cérebros e ajude a fixar capital humano nos países que têm sido mais afetados pela crise.
2.6. Fazer justiça: a trabalho igual, salário igual
Na União Europeia as mulheres têm de trabalhar, em média, mais 59 dias por ano para poderem ganhar o mesmo que os homens. Em Portugal é pior (65 dias) e está a ficar ainda pior: com a crise, a disparidade salarial aumentou 70% nos últimos cinco anos. A União Europeia já reconhece desde 1975, após uma sentença do seu Tribunal de Justiça, que a desigualdade salarial é uma violação dos direitos fundamentais. Embora o direito de ação coletiva junto do Tribunal de Justiça da UE (uma proposta do LIVRE — ver abaixo) permitisse às mulheres, representadas pelos seus sindicatos, exigirem a compensação devida por esta violação dos seus direitos, é possível também diminuir a desigualdade salarial por via legislativa e através da coordenação entre instituições europeias e estados-membro.
O LIVRE apresentará no Parlamento Europeu propostas para que se estabeleça uma meta de diminuição anual da desigualdade salarial entre homens e mulheres, quer através de medidas que corrijam as disparidades de pagamento entre trabalhadores de género diferente pela da subida dos salários das mulheres que desempenhem funções idênticas às dos homens, quer através de políticas que combatam simultaneamente a segregação laboral por setores e as divisões assimétricas de trabalho doméstico em função do género. A Comissão Europeia deverá verificar anualmente a evolução salarial nos estados-membro e promover a troca de boas práticas legislativas, laborais, empresariais e judiciais que permitam diminuir a diferença salarial e promover a igualdade de género. Uma revisão da diretiva correspondente (2006/54/EC) tornaria vinculativa a ação contra a desigualdade salarial, levando a procedimentos de infração para as empresas ou estados que não tomem ações razoáveis para diminuir as desigualdades salariais entre homens e mulheres. Cada pagamento desigual constituiria uma infração separada passível de ser multada, tornando incomportável a manutenção das desigualdades.
2.7. Criar e implementar regras comuns de trabalho digno para todos
Existe neste momento uma grande discrepância entre as condições de trabalho dos diferentes países da União Europeia. A progressiva degradação das condições de vida nos países economicamente mais debilitados tem cavado um fosso cada vez maior entre as condições de trabalho destes últimos e dos países com economias mais fortes. É fundamental que sejam criados mecanismos no seio da União que possam efetivar medidas de controlo desta discrepância de condições de trabalho, quer elas sejam remuneratórias, quer sejam no âmbito das regalias suplementares ou nos direitos fundamentais dos trabalhadores — mecanismos que sejam capazes de pôr fim ao encapotamento do desemprego com programas ocupacionais para desempregados ou à utilização de estagiários para ocupação de postos de trabalho efetivo.
O LIVRE propõe uma total reformulação das leis laborais relativamente às chamadas ETT (empresas de trabalho temporário) que, idealmente, levasse à sua extinção. A atual legislação, como a Diretiva 2008/104/CE, incentiva a existência do trabalho temporário — utilizando os argumentos de que facilita a flexibilidade nas empresas e a vida privada dos trabalhadores — e permite uma cada vez maior precarização dos trabalhadores, que leva inclusivamente à não renovação ou efetivação de trabalhadores a contrato e substituição pelo trabalho temporário.
As regras do trabalho temporário estão definidas pela legislação europeia, mas o controlo dos abusos não é feito. Deveria existir uma concreta fiscalização quer da atividade das ETT, quer das empresas utilizadoras — e a verdade é que não é feita por conveniência política. Este tipo de contratações deixa os trabalhadores reféns das empresas, sem voz para fazer valer os seus direitos, mesmo que estes estejam suportados por lei. A falta de fiscalização deixa mesmo ao arbítrio das empresas a possibilidade de prestações sociais, como o subsídio de desemprego, já que as constantes interrupções nos descontos para a Segurança Social impedem muitas vezes o acesso ao subsídio.
O LIVRE propõe, também, a criação de uma entidade supra-nacional específica — um tribunal arbitral dos direitos do trabalhador ou, no mínimo, de uma secção especial do Tribunal de Justiça da União Europeia, prevista pelos Tratados – ao qual pudessem recorrer trabalhadores da União Europeia, representados pelas suas estruturas sindicais e associativas. Esta entidade funcionaria como observador e poderia produzir recomendações e encaminhar para o Tribunal de Justiça da União Europeia situações graves de abusos ou que configurassem total desrespeito pelas leis europeias/nacionais e não fossem devidamente corrigidas. Entre estes abusos poderíamos incluir o assédio moral, já há muito praticado pelas empresas, que assume agora outras proporções dado que — para além de muito difícil de provar — as denúncias diminuem em tempos de elevadas taxas de desemprego, criando um campo ainda mais fértil para o incumprimento dos direitos laborais.
2.8. Determinar regras para salários mínimos na União Europeia
A inexistência de um ordenado mínimo, ou a existência de um salário mínimo baixo, criam as condições para um dumping social generalizado na União Europeia, o que é mau para os trabalhadores e para a economia. A definição de um ordenado mínimo na União Europeia, que não seja um simples alinhamento pelo ordenado mínimo mais baixo, será uma garantia pan-europeia de remuneração justa do trabalho.
No Parlamento Europeu, o LIVRE defenderá a existência de um ordenado mínimo europeu, adaptado a cada estado com base no seu salário médio, de modo a garantir a coesão social e económica e a existência de uma Europa Social.
2.9. Criar mecanismos eficazes de regulação das agências de notação
As notações de crédito estão entre os principais fatores que influenciam o movimento das forças de mercado, já que têm um impacto direto sobre o risco percebido e os preços. Esta é uma posição desproporcionalmente vantajosa, que pode distorcer as operações do mercado e levar a casos de conluio ou conflito de interesses.
O LIVRE defende que a supervisão das agências de notação deve ser concomitante com a sua potência para moldar ou manipular o mercado. No Parlamento Europeu, o LIVRE apoiará o estabelecimento de regras rígidas ao nível da União, com critérios vinculativos no campo da metodologia, da divulgação de resultados e da escala da classificação de crédito, entre outros. O LIVRE defenderá que sejam eliminados os conflitos de interesses, proibindo as agências de notação de avaliar entidades nas quais tenham participação acionista, que concorram com entidades em que tenham essa participação, ou quando as agências tenham participações em negócios que possam beneficiar das suas próprias notações.
2.10. Instituir um Rendimento Básico Universal Adaptado
Segundo certas estimativas, cerca de 25 milhões de pessoas na Europa vivem abaixo do limiar da pobreza. Este fenómeno representa uma enorme injustiça social na distribuição de recursos e direitos e leva as pessoas que por ele são afetadas a uma espiral descendente de exclusão e miséria extrema.
O LIVRE defende para a União uma ação concertada para erradicar a pobreza do seu território. Rumo a esse fim, consideramos que deve ser garantido um rendimento universal, mas diferenciado em cada estado-membro, cobrindo todas as pessoas que vivam abaixo do limiar da pobreza. Por “universal”, entende-se que ele será aplicado a qualquer pessoa, sem referência à sua origem étnica, religião, educação, sexo, orientação sexual ou qualquer outro motivo. E por “diferenciado”, sugere-se que cada estado-membro possa adotar taxas diferentes, determináveis em justaposição com o rendimento médio do país em questão.
2.11. Consagrar um pacto para eliminar a concorrência fiscal
Uma característica da crise sistémica da zona euro foi o incremento de fluxos de capitais dos países que mais sofreram com a crise para os países com políticas tributárias e regimes empresariais mais frouxos. Em consequência, os países da crise foram privados de material tributável, o que resultou em pressões ainda maiores sobre a sua saúde orçamental. Tal concorrência fiscal, nomeadamente entre estados-membro da União, assemelha-se, em muitos aspetos, a uma corrida para o fundo que amplifica os efeitos da crise.
No Parlamento Europeu, o LIVRE promoverá a ideia de um pacto da União para eliminar esta concorrência fiscal entre estados-membro. Os benefícios são de três tipos: (i) remover um dos fatores que agravaram a crise e que podem contribuir para uma próxima crise, (ii) facilitar o caminho para a aproximação de todas as políticas fiscais, e (iii) dar um bom exemplo ao resto do mundo sobre as formas de abordar as questões dos paraísos fiscais e das jurisdições sigilosas. O sinal deve ser claro: os benefícios fiscais de um estado-membro não devem vir à custa de outro, e a UE deve recusar-se a dar qualquer endosso tácito aos regimes associados à lavagem de dinheiro.
2.12. Instituir uma cláusula social vinculativa a todas as reformas económicas
No contexto da atual crise, a expressão “reforma económica” tornou-se quase sinónima de “redução dos direitos sociais”. Os programas da troika são estudos de caso de “reformas” sustentadas por preconceitos ideológicos que veem os direitos sociais como impedimentos da estabilidade orçamental e do crescimento económico.
O LIVRE é da firme opinião de que a União não se dar pode dar ao luxo de promover tais predisposições ideológicas que são altamente prejudiciais aos cidadãos europeus. É necessário reorientar o sentido das reformas económicas para a obtenção de um alto grau de desenvolvimento social, económico, ambiental e político. Defendemos a adoção de uma cláusula abrangente de direitos sociais, a ser incorporada em todos os programas de reforma económica, que oriente a ação da União e dos seus estados-membro rumo a objetivos de igualdade e redistribuição. Os direitos sociais devem ser o ponto central de qualquer política económica e não as suas vítimas.
2.13. Estabelecer critérios de condicionalidade ambiental para os investimentos de longo prazo da União
Ao decidir sobre a distribuição de fundos, o Banco Europeu de Investimento (BEI) faz uso apenas de critérios financeiros para determinar se um projeto é digno de receber crédito. Ao avaliar a solidez financeira do projecto, o BEI permanece alheio a outros aspetos do mesmo, tais como o seu impacto ambiental.
No Parlamento Europeu, o LIVRE defenderá que a metodologia do BEI precisa de estar alinhada com os objetivos e as linhas gerais da “Estratégia Europa 2020” da União Europeia. Para esse fim, devem ser introduzidos critérios vinculativos para qualquer financiamento do BEI que garantam que este não contradirá esses objetivos. Na frente ambiental, o BEI deve passar a valorar o respeito pela necessidade de reduzir o impacto ambiental negativo da União Europeia. Dito de outro modo, o BEI deve tendencialmente afastar-se de dar financiamento a projetos que aumentem a pegada ambiental da UE.
2.14. Criação de uma Agência Europeia de Notação de Crédito
Atualmente, a União não tem qualquer mecanismo oficial para avaliar a saúde financeira de entidades públicas ou privadas. Como tal, as informações sobre a solvência de qualquer entidade, que podem por exemplo condicionar a sua possibilidade de obter crédito, vêm sempre de fontes privadas, e em especial das três principais agências de notação de crédito (Standard & Poors, Moody’s e Fitch) . Não só isso torna estas empresas privadas definidoras de facto de políticas públicas, como também implica o risco de utilização de informações enviesadas — como prova o péssimo desempenho passado dessas empresas privadas.
É possível quebrar o domínio das agências de notação privadas sobre a definição de políticas públicas. No Parlamento Europeu, o LIVRE defenderá que, através de legislação secundária, a União avance para a criação de uma agência que emita informação sobre entidades públicas e privadas residentes na União Europeia. Esta agência irá complementar as operações do Banco Central Europeu e do Banco Europeu de Investimento, que usam tais informações para a condução das suas políticas. Além disso, essa agência oferecerá a vantagem de ser um sujeito de direito da UE, o que significa que terá de acomodar os objetivos gerais da União (incluindo a coesão, o pleno emprego e a solidariedade), respeitar o acervo comunitário e estar sujeita ao controlo do Parlamento Europeu.
2.15. Criar regras comuns de Conduta Empresarial
O corpo jurídico que compõe o mercado único confere às empresas direitos e obrigações na área comercial. No entanto, a União não é apenas o mercado interno, mas também uma união de princípios e valores que devem ser refletidos na condução dos negócios.
O LIVRE defende o desenvolvimento de uma estratégia geral da União com o objetivo de integrar, em toda a legislação futura, dos direitos fundamentais e os valores da União Europeia. Uma tal abordagem poderá envolver questões como a igualdade de género, regras comuns sobre a responsabilidade social corporativa, bem como a redução das discrepâncias na remuneração de diretores e outros funcionários.
2.16. Iniciar um plano europeu contra a pobreza infantil
De acordo com um relatório da EAPN — Rede Europeia Anti-Pobreza — são as “crianças o grupo mais vulnerável a situações de pobreza ou exclusão social. A taxa de risco de pobreza ou exclusão social para as crianças subiu em 2012 para 28.1% (UE28) (2010: 26.9%, UE28). Para Portugal e segundo a Eurostat a taxa de risco de pobreza para as crianças foi de 27.8%”. A pobreza infantil coloca em risco o desenvolvimento de toda uma sociedade. As crianças vítimas da pobreza têm, na maioria das vezes, baixos níveis de nutrição, ficando mais expostas a problemas de saúde, com fraco rendimento escolar, caindo muitas vezes num ciclo de exclusão social que pode tornar-se geracional. O crescente desemprego no espaço europeu tem feito aumentar consideravelmente os riscos de pobreza infantil, tendo em conta a total dependência das crianças relativamente ao rendimento dos pais e ainda a enorme diminuição dos apoios sociais às famílias.
O LIVRE considera prioritária a luta à pobreza infantil no espaço do Parlamento Europeu. Esta luta deverá focar-se prioritariamente na pressão para a criação e implementação de políticas de emprego dirigidas particularmente a famílias carenciadas, em especial famílias numerosas com rendimentos muito reduzidos, ou a famílias monoparentais. Dever-se-á ainda encorajar os estados-membro a adotarem medidas de reforço do orçamento das famílias mais atingidas e em claro perigo de pobreza extrema, como por exemplo, a subsidiação de habitação condigna. Um Plano Europeu contra a Pobreza Infantil é uma luta política que pode ser ganha, convencendo cada estado-membro a contribuir para um fundo comum que seria duplicado pelos fundos comunitários e assistido pelos projetos-piloto que podem ser financiados por decisão do Parlamento Europeu. Este Plano Europeu, cuja justificação moral e pública é inquestionável, poderia servir de exemplo para outras ações da União na mitigação dos efeitos da crise.
2.17. Redigir uma Carta Europeia dos Direitos do Cidadão Sénior
Nunca os direitos dos cidadãos estiveram tanto em causa como hoje, em particular os direitos dos cidadãos que, tendo atingido a idade de reforma, após décadas de contribuição para o bem comum, se veem totalmente dependentes dos humores dos governos, que viram nos cidadãos seniores uma fonte de recursos apetecível para a persecução dos seus objetivos de rigor orçamental. Esta escolha desastrosa de esbulho dos mais frágeis, veio trazer consequências aos mais diversos níveis: de um aumento da pobreza geral à diminuição do suporte que os cidadãos seniores vinham prestando às famílias, em especial depois do rebentamento da crise financeira em 2008, e também a um consequente aumento do abandono dos idosos e até dos maus tratos a que estão sujeitos.
O LIVRE defende o estabelecimento de um marco jurídico de proteção dos direitos dos cidadãos acima dos 65 anos, uma proporção crescente da população europeia. A exemplo do que foi feito no Brasil durante a presidência de Lula da Silva, com o Estatuto do Idoso, esta Carta Europeia dos Direitos do Cidadão Sénior protegeria direitos positivos, como os de acesso à cultura ou de participação na vida cívica, ao mesmo tempo que daria uma base legal para a regulação da prestação de serviços médicos, o enquadramento dos estabelecimentos de apoio a idosos, ou até o agravamento de penas por violência doméstica ou institucional de que sejam vítimas estes cidadãos numa fase da vida em que se encontram numa situação particular de vulnerabilidade.
2.18. Desenvolver e promover políticas de proteção do Direitos dos Cidadãos Portadores de Deficiência
O Parlamento Europeu tem a decorrer uma iniciativa sobre assistência pessoal para cidadãos portadores de deficiência que pretende, através de uma normativa europeia, pôr em curso políticas de promoção de uma vida independente, como previsto no artigo 19 da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, de 2006. O LIVRE considera esta iniciativa de grande relevância social, tendo em conta que a grande depressão financeira que assola a Europa tem vindo a atingir de forma ainda mais dura os cidadãos mais fragilizados, entre eles os portadores de deficiência. De acordo com o Observatório da Deficiência e Direitos Humanos, num estudo sobre o Impacto dos Planos de Austeridade dos Governos Europeus nos Direitos das Pessoas com Deficiência, o desemprego entre as pessoas portadoras de deficiência é mais do dobro do que entre os cidadãos sem qualquer deficiência. Essa tendência tem vindo a agravar-se e a União Europeia corre o risco de colocar cerca de 80 milhões de cidadãos em pobreza extrema de acordo com um relatório da European Foundation Centre’s European Consortium on Human Rights and Disability.
O LIVRE propõe uma normativa que proíba os estados-membro de adotarem medidas de redução de apoios aos cidadãos portadores de deficiência, como tem vindo a acontecer. Propõe ainda que o Parlamento exorte os estados-membro à adoção de programas de consciencialização dos cidadãos e dos organismos, públicos ou privados, nacionais ou europeus, para a necessidade urgente de integração e promoção do emprego para aqueles cidadãos, com o objetivo sério de conseguirem uma vida independente e de integração plena.
2.19. Libertar o potencial da cultura, da criatividade e do ativismo
Antes de um projeto de comunidade económica comum e de um modelo de desenvolvimento social partilhado, a Europa aprendeu a conhecer-se, para lá da condição geográfica de relativa proximidade, como uma realidade cultural.
Para o LIVRE, a ideia de Europa como espaço de liberdade e potência criativa deve encontrar na UE28 uma garantia, e ser também uma dinamizadora ativa, quando hoje a UE se confronta com o retrocesso da sociedade do trabalho. Na era pós-industrial, ao trabalho humano só se pode reservar um futuro na medida em que se souber evoluir para as atividades culturais e criativas. Por estas razões, o LIVRE defenderá a implementação de políticas de estímulo, a nível europeu, à produção cultural e artística, bem como a atividades voluntárias dos cidadãos benéficas para a sociedade como, por exemplo, o desenvolvimento da economia de transição, a intervenção social e política e os projetos sem fins lucrativos destinados ao bem das comunidades.
2.20. Criar um Estatuto Europeu para os Bens Públicos
Ao mesmo tempo que impõe às populações o empobrecimento, o neoliberalismo de estado que assola a União com o programa de austeridade agenda a mercantilização dos serviços e bens públicos. Com base no argumento de que o privado gere melhor do que o público ou de que o público tira oportunidades à iniciativa privada, estruturas do estado social como a escola pública e os serviços de saúde, bens culturais como o património histórico, bens naturais como o património ambiental, ou ainda bens vitais como a água potável, são levados para uma lógica de mercadoria, se não mesmo de privatização, pondo em causa o direito das populações a um igual e universal acesso a esses bens. Sob a ameaça de corte de financiamento, esta transformação é forçada nos países sujeitos a programas de ajustamento.
Para o LIVRE, é crucial para uma Europa como projeto de coesão social a salvaguarda dos seus bens públicos e, também, do entendimento do que são, dentro da UE28, os bens públicos. Para isso defende a criação de um Estatuto Europeu para os Bens Públicos que estabeleça juridicamente: i) a definição de bens públicos como todos os bens — independentemente de quem os detém ou de quem os gere — de que depende a população em geral e o interesse comum da sociedade; ii) a categorização em classes dos bens públicos; iii) a fixação dos princípios de uma gestão dos bens públicos, com imposição legal de limites explícitos à sua mercantilização e/ou à sua privatização.
2.21. Reparar e reforçar o esquema europeu de emissões de carbono
Desde 2005, a União Europeia, juntamente com a Islândia, a Noruega e o Liechenstein tem em prática um Regime de Comércio de Emissões — EU ETS. O objetivo principal deste regime é combater as alterações climáticas, promovendo a redução das emissões industriais de gases com efeito de estufa de um modo eficaz e economicamente atrativo. Para tal, é estabelecido um teto máximo de emissões para cada unidade industrial e são distribuídos créditos de emissão de forma gratuita ou via leilão. Com exceção do setor elétrico – que deve comprar todos os seus créditos de emissão – grande parte dos outros setores abrangidos, incluindo o da aviação, recebe a maioria dos créditos de forma gratuita. Criando um mercado para os créditos de emissão, as unidades industriais que emitam menos do que o teto que lhes foi atribuído podem vender o excesso de créditos de emissões que dispõem a outras unidades que tenham ultrapassado o seu teto.
Por ser o maior regime a nível mundial, o Regime Europeu de Comércio de Emissões tem um papel importante na política ambiental europeia. O LIVRE, reconhecendo a importância do combate às alterações climáticas, defende o reforço do EU ETS. Em primeiro lugar, o EU ETS deve contemplar os seis gases com efeito de estufa abrangidos pelo Protocolo de Quioto, pois atualmente cobre apenas três. Em segundo lugar, os créditos de emissão dados de forma gratuita devem ser reduzidos, de modo a compensar verdadeiramente as unidades industriais que apostam na redução das suas emissões. Finalmente, o setor da aviação deve alargar o seu âmbito aos voos de e para a Europa, pois atualmente apenas os voos no espaço aéreo europeu estão abrangidos.
2.22. Construir uma nova Estratégia Europeia de Desenvolvimento Sustentável
A Estratégia Europeia de Desenvolvimento Sustentável (EEDS), adotada em 2001, expirou em 2012. A EEDS, que do ponto de vista civilizacional deveria constituir-se como um documento orientador de base às políticas de desenvolvimento económico e a todas as demais medidas que tenham implementação no espaço europeu, foi descontinuada pela Comissão Europeia (CE) sob o pretexto de inculcar na Estratégia Europa 2020 (EE2020) o teor de sustentabilidade necessário. Mas a EE2020 está orientada para a competitividade e o crescimento.
Para o LIVRE, os cidadãos europeus merecem um futuro sustentável. A confiança que os europeus colocam nas decisões que são tomadas pelas autoridades europeias e nacionais necessita de documentos reais, concretos e vinculativos que assegurem a implementação dos princípios mais básicos de sustentabilidade ambiental. O LIVRE defende a construção de uma nova Estratégia de Desenvolvimento Sustentável que atualize o quadro dos desafios atuais, estabeleça os limites e aponte as opções mais inteligentes para os resolver.
2.23. Estabelecer uma política europeia climática e energética mais resoluta
A União Europeia (UE) mostrou ao mundo que é possível estabelecer metas de redução dos gases com efeito de estufa e alcançá-las dentro do prazo previsto, promovendo a reforma de tecnologias ultrapassadas e poluentes e incentivando a inovação tecnológica e o desenvolvimento de novas formas de energia. A crise financeira e económica e o fim do período de cumprimento do Protocolo de Quioto serviram de pretexto para várias nações se excluírem do trabalho necessário para as próximas décadas.
Para o LIVRE, a UE deve manter três metas juridicamente vinculativas até 2030, que permitam um aumento das temperaturas médias globais abaixo dos 2°C: uma redução das emissões de pelo menos 60%, aumento da eficiência energética em pelo menos 40% e inclusão de pelo menos 45% de fontes renováveis no conjunto da produção energética total. A UE deve procurar ser o melhor exemplo possível para o mundo, mantendo a pressão para que um verdadeiro acordo mundial vinculativo seja finalmente ratificado entre todas as nações do planeta.
2.24. Reformular a Diretiva Europeia de Tributação Energética
A revisão da Diretiva Europeia de Tributação Energética é uma oportunidade fundamental para avançar com uma reforma fiscal ambiental especificamente no setor energético. A Comissão Europeia (CE) apresentou a sua proposta, que divide a tributação em duas vertentes — teor energético e emissões — e assume todos os tipos de combustível de forma igual. Contudo, os valores mínimos propostos para as taxas não funcionarão como incentivo para um comportamento mais responsável. A mesma proposta assume que os biocombustíveis não produzem emissões, o que do ponto de vista da análise de ciclo de vida está errado.
Para o LIVRE, a CE deve manter o teor fundamental da sua proposta mas propor taxas mais ambiciosas, com mecanismos de ajuste flexíveis que incentivem o uso inteligente dos combustíveis. Além disso, não deve permitir exceções e deve adotar uma postura de ciclo de vida integrado das fontes energéticas consideradas. O Parlamento Europeu deve assegurar que a reforma desta importante Diretiva se faça neste sentido.
2.25. Centrar a Política Agrícola Comum nas necessidades europeias e na sustentabilidade ambiental
A Política Agrícola Comum (PAC) transformou a forma como se faz agricultura na Europa. Num ano em que se iniciará a implementação da PAC 2014-2020, é preciso assegurar que cada estado-membro, através do respetivo Programa de Desenvolvimento Rural, utilize da melhor forma possível os fundos disponíveis, assegurando as necessidades alimentares dos europeus e reduzindo o seu impacto ambiental.
Para o LIVRE, a Comissão Europeia deve, em estreita colaboração com o Parlamento Europeu, aproveitar as oportunidades que tem nos processos de negociação dos Programas de Desenvolvimento Rural para limitar o recurso a verbas europeias de práticas agrícolas danosas para o ambiente. Prosseguindo a orientação reformista, deve-se iniciar o processo de construção de uma PAC com um Segundo Pilar (ambiental) reforçado e um Primeiro Pilar condicionado a compromissos de conformidade ambiental.
2.26. Colocar a ecologia na orgânica das instituições financeiras internacionais
A maior parte dos grandes problemas ambientais a que os cidadãos europeus assistem, quer no próprio território europeu quer noutras regiões do globo, resulta da forma como a economia, o comércio e as finanças funcionam à escala global, fazendo repercutir nas escalas regionais e nacionais o distanciamento com que operam em relação à realidade ambiental. Do ponto de vista ecológico, foram ultrapassados os limites em matérias tão diversas como a taxa de extinção da diversidade biológica mundial e o aumento da acidez dos oceanos, entre muitos outros.
Para o LIVRE, a UE deve ir para lá das intenções assumidas na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável Rio+20 e exercer pressão junto das principais instituições financeiras internacionais (Banco Mundial, Organização Mundial do Comércio e Fundo Monetário Internacional) para que avancem com uma reforma das suas orgânicas internas, de forma a contextualizar do ponto de vista da sustentabilidade os princípios com que orientam a sua ação à escala global.
2.27. Construir uma indústria de prestação de serviços dos ecossistemas
Os ecossistemas europeus providenciam um conjunto de serviços sem os quais a vida na Europa seria impossível. Desde a regulação do ciclo hídrico à produção de oxigénio e de alimento, são inúmeras e complexas as formas como as sociedades europeias dependem do funcionamento dos sistemas naturais, assentes na biodiversidade europeia. Mas, para além dos alimentos e de outros recursos explorados diretamente e colocados em mercados existentes, a maior parte dos proprietários não tem forma de receber o pagamento económico merecido pelo serviço de manutenção prestado às funções de ecossistema que proteja e nas quais invista. Na prática, a sociedade atribui um valor zero ao serviço de que usufrui.
Para o LIVRE, no quadro da PAC, da Diretiva-Quadro da Água e de outros documentos relevantes, é essencial criar formas de reconhecimento do valor económico dos serviços prestados pelos ecossistemas, para que simultaneamente seja possível incentivar a conservação da natureza e criar novas oportunidades económicas e emprego.
2.28. Combater a extinção de espécies na Europa
A União Europeia centra a sua atividade no que concerne à conservação da natureza, e em particular da biodiversidade, nas Diretivas Habitats e Aves e em documentos como a Estratégia Europeia para a Biodiversidade 2020 e o Plano de Ação Europeu para travar a perda de biodiversidade. No entanto, os estados-membros falham na implementação destes regulamentos, aproveitando regimes de exceção que permitem ultrapassar as diretivas, sob o pretexto do interesse nacional associado à construção de grandes infraestruturas e obras públicas e privadas.
Para o LIVRE, é fundamental que na Comissão Europeia sejam adotados mecanismos de fiscalização que avaliem de que forma estão a ser implementados nos estados-membro os regulamentos que visam salvaguardar a biodiversidade. Nos próximos quadros de financiamento é vital dotar os mecanismos financeiros adequados – como o LIFE – de verbas que permitam combater os impactos negativos existentes. Para o LIVRE, a própria Rede Natura 2000 pode ser promotora de emprego e não apenas de qualidade de vida e valor ambiental.
2.29. Combater os maus tratos aos animais à escala europeia
A União Europeia tem vindo a otimizar os documentos que regulamentam a forma como os europeus podem lidar com os seus animais de companhia e com os animais que ainda são explorados pela indústria alimentar.
Para o LIVRE, a Europa deve ser um território liberto de sofrimento animal desnecessário e gratuito. O Conselho Europeu deve dedicar mais da sua atenção às questões éticas com que as indústrias europeias lidam na sua relação com seres de espécies animais não humanos.
2.30. Proibir a privatização da água
Entre os bens públicos, alguns são particularmente sujeitos à pressão mercantil, quer pela sua escassez, quer pelo crescimento populacional. É o caso da água potável, cuja partilha está condicionada por fatores geográficos, climáticos, perenes ou sazonais, que tenderão, cada vez mais, a repercutir consequências geopolíticas possivelmente mais graves do que as desencadeadas pela posse de recursos energéticos como o petróleo. A água potável é um bem essencial absolutamente imprescindível à vida humana, cuja provisão tem de estar permanentemente garantida a todos, de acordo com princípios de redistribuição cada vez mais rigorosos.
Para o LIVRE, é imperativo parar a mercantilização da água potável no espaço da UE. A água só deve ser paga, além de taxas razoáveis para a manutenção do serviço, no quadro de uma gestão pública, para penalizar consumos acima dos valores estimados por princípios de redistribuição deste bem. Só assim se poderá evitar a pressão para a sua privatização e a consequente limitação do seu acesso a quem a pode pagar, tornando-a objeto de contenda. Para o LIVRE, a UE deve condicionar a aceitação como parceiros económicos dos países cujas populações sofram de falta de acesso a água potável em virtude de processos de mercantilização deste bem.
3. Criar uma verdadeira União de Direitos Fundamentais
3.1. Dar armas aos cidadãos: por um direito de ação coletiva no Tribunal de Justiça da UE
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) é uma peça essencial da construção europeia mas tem desempenhado um papel demasiado parcelar, para não dizer parcial. Por um lado esse papel deve-se à sua história: nascido numa comunidade económica, especializou-se num papel de garante do mercado; por outro lado, deve-se a quando o fazem trabalhar e porquê: neste momento só as instituições europeias, os estados-membro e as partes diretamente afetadas podem recorrer de forma imediata ao TJUE. Não é possível, ao contrário do que se passa noutros Supremos Tribunais do mundo, que classes de indivíduos possam recorrer coletivamente ao TJUE. Isto também ajuda a explicar porque houve tantos casos de regras de concorrência no TJUE, mas tão poucos baseados nas provisões mais fundamentais dos tratados ou na Carta Europeia dos Direitos Fundamentais. Vimos acima como a troika poderia ser levada a tribunal — desde que houvesse alguém para fazê-lo. É preciso finalmente dar passos para que o TJUE se transforme num garante dos cidadãos europeus.
O LIVRE defenderá em sede de revisão dos Tratados o direito de ação coletiva junto do TJUE. Este direito permitirá a categorias amplas de trabalhadores, consumidores ou moradores fazer valer os seus direitos e procurar compensação por danos sofridos. Mas o LIVRE defende também que um número mínimo de cidadãos de um estado-membro, ou de mais do que um estado-membro, possa levantar questões de âmbito “constitucional” no TJUE. Outra proposta do LIVRE levaria à implementação desses direitos em Portugal, mesmo sem mudança dos Tratados, a exemplo de alguns estados‑membros, como a França, que têm já criados mecanismos automáticos para levar, através da sua administração, um caso apresentado coletivamente ou por entidades representativas dos cidadãos (sindicatos, associações de consumidores, etc.).
3.2. Criar um Tribunal Constitucional da União: a Comissão de Copenhaga
Após o Tratado de Lisboa, o artigo 2º do Tratado da União Europeia passou a declarar que os alicerces do projeto europeu são o respeito pela dignidade humana, o estado de direito e a democracia, a liberdade e a igualdade, os direitos humanos e o respeito pelas minorias. Em simultâneo, o mesmo artigo vincula os estados-membro ao respeito destes mesmos “valores da União”. A relevância deste artigo não é fácil de sobrestimar: basicamente institui a UE como União de Valores Democráticos — embora ainda não uma democracia plena — e obriga os seus estados-membro a aceitarem e promoverem os mais altos níveis de respeito pelo estado de direito e a democracia mesmo depois de terem entrado na União. O problema é agora um: quem determina que estes valores estão a ser respeitados, e o que fazer em caso de haver uma crise do estado de direito, dos valores democráticos e dos direitos fundamentais na União?
Com o “Relatório Tavares” sobre Direitos Fundamentais na Hungria, foi registada uma triste estreia na União: pela primeira vez foi identificado um estado-membro que se afastou ou violou de forma sistémica os princípios a que tinha sido instado a aderir quando entrou na União (os chamados “Critérios de Copenhaga” de respeito pela democracia, o estado de direito, e os direitos fundamentais). Entre os vários instrumentos propostos por esse relatório está o do estabelecimento de uma “Comissão de Copenhaga” que poderia ser constituída por representantes dos Tribunais Constitucionais e Supremos Tribunais da União, Provedores de Justiça e elementos da sociedade civil e dos movimentos de liberdades cívicas, mas acima de tudo personagens independentes, prestigiadas e tecnicamente capacitadas para fazer análises e recomendações normativas a partir da base legal do Artigo 2º — o mais importante dos Tratados europeus. Esta Comissão de Copenhaga poderia receber pedidos de relatórios por parte das instituições europeias, mas também teria iniciativa para agir quando houvesse passividade dos políticos no Parlamento, dos funcionários ou dos governos no Conselho perante graves violações da democracia, do estado de direito ou dos direitos fundamentais na União. Com o tempo, esta Comissão de Copenhaga poderia evoluir para desempenhar funções de tribunal constitucional e de garante do estado de direito democrático na União Europeia.
3.3. Continuar o processo de adesão da União Europeia à Convenção Europeia dos Direitos do Homem
Com o Tratado de Lisboa a União Europeia obrigou-se, através do artigo 6º do TUE, a aderir à Convenção Europeia dos Direitos do Homem – instrumento de direitos humanos adotados pelos estados-membro do Conselho da Europa e a principal referência em matéria de Direitos Humanos em toda a Europa, em conjunto com a Carta dos Direitos Fundamentais. Quando o processo de adesão, iniciado em 2010, terminar, a União Europeia tornar-se-á no 48º signatário de uma convenção que é aplicável a todo o espaço europeu, desde Portugal até à Rússia, incluindo a Islândia, a Suíça e a Turquia. Aderir à convenção significa que os atos das instituições da União Europeia ficarão sujeitos às mesmas regras de direitos humanos e ao mesmo controlo que já é praticado nos seus 28 estados-membro. A adesão à convenção traduz-se, assim, num reforço da proteção dos direitos humanos na Europa. Neste momento, a União Europeia e o Conselho da Europa estão à espera de um parecer do Tribunal de Justiça da União Europeia sobre a questão.
O LIVRE defende a conclusão célere do processo de adesão da União Europeia à Convenção Europeia dos Direitos do Homem como forma de reforçar a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos europeus nas suas relações com as instituições e as políticas europeias. Isto representaria a possibilidade de questionar a compatibilidade dos atos das instituições e agentes da União Europeia com as regras de direitos humanos aplicáveis na Europa junto do Tribunal Europeu. Isto significa que os cidadãos europeus poderão apresentar queixas contra a UE por alegadas violações dos seus direitos fundamentais.
3.4. Educação para todos: pública, gratuita e universal
Em 2010 a União Europeia e os seus estados-membro comprometeram-se com a chamada Estratégia Europa 2020 – uma estratégia de crescimento para a União Europeia de 2010 a 2020. Entre outros objetivos encontram-se a diminuição da taxa de abandono escolar precoce para 10% e o aumento para 40% da percentagem da população entre os 30 e os 34 anos com diploma de ensino superior. Em ambos os objetivos Portugal está pior do que a média da União Europeia, tendo hoje 20,8% de taxa de abandono escolar e 27,2% da população entre os 30 e os 34 anos com diploma de ensino superior.
A meio caminho entre 2010 e 2020, a União Europeia e os estados-membro devem manter as promessas realizadas. No Parlamento Europeu o LIVRE irá trabalhar para que a União ajude os estados-membro a atingir estes objetivos, de modo a garantir o futuro dos jovens europeus.
3.5. Criação do Estatuto de Associação Europeia
Uma democracia europeia apenas será possível com uma sociedade civil europeia. São hoje milhões de cidadãos europeus que, livre e voluntariamente, se juntam em associações em toda a Europa. A União Europeia deve dar reconhecimento institucional ao ativismo destes cidadãos. Respeitando o princípio da subsidariedade, este estatuto será opcional e ideal para as associações que pretendam desenvolver atividades transnacionais.
O LIVRE, no Parlamento Europeu, irá promover o desenvolvimento de um Estatuto de Associação Europeia de modo a dar ferramentas aos cidadãos que todos os dias ajudam a criar uma cidadania europeia.
3.6. Garantir a mobilidade jovem na União
O Programa Erasmus, criado em 1987, é hoje o mais conhecido programa de mobilidade jovem na União Europeia, tendo ajudado a criar a primeira geração pan-europeia. Apesar do sucesso do Erasmus e apesar dos seus enormes benefícios para a construção da Europa, para a integração social e para o aumento da competitividade económica, a mobilidade jovem não está generalizada.
No Parlamento Europeu o LIVRE lutará por reforçar os programas de mobilidade e por criar garantias de acessibilidade a estes programas para todos os jovens europeus, independentemente do seu poder económico.
3.7. Efetivar a Carta dos Direitos e Responsabilidade dos Voluntários
A Carta foi uma proposta do European Youth Forum em 2011, de modo a criar na União Europeia condições para facilitar o voluntariado, melhorar a sua qualidade, aumentar o seu reconhecimento e colocar a importância devida da sua realização.
O LIVRE irá trabalhar para que a Carta dos Direitos e Responsabilidades dos Voluntários seja aprovada, implementada e promovida, de modo a incentivar a prática do voluntariado por toda a União e garantir a igualdade de direitos.
3.8. Instituir um sistema de vistos humanitários, desmontar a “Europa Fortaleza”
O espaço de “liberdade, segurança e justiça” de que se fala nos textos fundadores da União continua em total contradição com o que se passa nas fronteiras externas da UE, verdadeiras muralhas intransponíveis para quem necessita de proteção: os controlos são cada vez mais rigorosos, os meios legais de entrada na UE permanecem limitados, os requisitos de vistos e passaporte exigidos a estes cidadãos são absurdos (como se fosse possível obter das autoridades de um país de que se foge um passaporte para deles fugir). Em violação dos compromissos internacionais assumidos, os estados-membro recusam definir políticas comuns de asilo que garantam a proteção destes refugiados. Por outras palavras: é a Europa fortaleza que obriga os milhares de refugiados a arriscarem as suas vidas por uma vida melhor. E todos os anos morrem aos milhares às portas da Europa.
O LIVRE defende que a UE tem o dever de garantir a proteção destes refugiados e acredita que a agência FRONTEX não é a instituição adequada para lidar com estas situações humanas dramáticas. A UE deve estabelecer um sistema comum de asilo baseado na solidariedade entre estados-membro, assumindo a responsabilidade humanitária de coordenar resgates e salvamentos de náufragos no Mediterrâneo, alargando o conjunto de possibilidades de acesso legal e seguro ao território da União e atribuindo, por exemplo, vistos humanitários. O LIVRE é determinadamente contra o Regulamento de Dublin II que obriga os refugiados a requerer asilo apenas no país por onde entraram na União Europeia e apela à sua revisão completa. Para além destas medidas, acreditamos que a UE deve dar prioridade, nas suas relações com os países de origem destes refugiados e nas suas políticas de comércio e de desenvolvimento, às questões que obrigam todos os anos milhares de pessoas a migrar.
3.9. Acabar com a tragédia é possível: implementar o Programa Europeu de Reinstalação de Refugiados
Segundo dados recentes do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), há 40 milhões de refugiados no mundo. 200.000 são os mais vulneráveis dos já vulneráveis – vítimas de tortura, mulheres e crianças vítimas de violência sexual, pessoas em situação débil (doenças que não possam ser cuidadas, por exemplo) e crianças não acompanhadas (quando é no seu melhor interesse) — que vivem em campos de refugiados e que todos os anos devem ser reinstalados em países de acolhimento para poderem reconstruir as suas vidas. Mas apenas 100.000 desses 200.000 encontram um novo lar, e porquê? Ao contrário dos Estados Unidos, que reinstalam 80.000 refugiados por ano, os 28 estados-membro da UE acolhem, todos juntos, apenas 4500 pessoas no seu território. Já foi criado um Fundo Europeu para reinstalação de refugiados e existem linhas orçamentais para que os estados-membro fragilizados pela crise económica possam ajudar a cumprir as promessas europeias na sua reinstalação. No entanto, o número dos refugiados acolhidos na UE não descola e um Programa Europeu de Reinstalação de Refugiados parece comprometido. Milhares de sírios que esperam há meses nos campos de refugiados da Turquia e da Jordânia por uma solução internacional poderiam ter sido já ajudados.
Fora e dentro do Parlamento Europeu, o LIVRE trabalhará para que os estados-membro usem os recursos financeiros já existentes e para que, com a criação de um Programa Europeu de Reinstalação de Refugiados, coordenem e partilhem a responsabilidade de ajudar a resolver estas situações humanitárias dramáticas.
4. Construir uma Democracia Europeia para o mundo
4.1. Votar para decidir: por um governo da União numa democracia parlamentar europeia
Após as eleições europeias de 2014, o Conselho da União Europeia, com base no resultado eleitoral, irá nomear um candidato para Presidente da Comissão Europeia, que terá depois de obter uma maioria absoluta de deputados no Parlamento Europeu. Sendo esta uma melhoria em relação à realidade anterior ao Tratado de Lisboa, é possível tornar a escolha da Comissão Europeia mais transparente e democrática.
Assim, o LIVRE propõe que os membros da Comissão Europeia, incluindo o seu Presidente, sejam eleitos pelo Parlamento Europeu e escolhidos de entre os seus deputados, dando mais um passo na constituição de um executivo da União obrigado a prestar contas aos cidadãos europeus.
4.2. Reforçar os poderes do Parlamento Europeu: um legislador e co-decisor completo
O Parlamento Europeu detém o chamado poder de “co-decisão”. Este procedimento dá ao PE o poder de adotar instrumentos juntamente com o Conselho da UE, exceto nos muitos casos previstos pelos Tratados (como por exemplo assuntos relacionados com o mercado interno, com o direito da concorrência ou acordos comerciais internacionais, casos em que a Comissão e o Conselho devem apenas consultar o PE). Por outro lado, e ao contrário do que acontece na maioria dos parlamentos nacionais, o PE não detém qualquer poder de iniciativa legislativa. Assim, o artigo 224º do TFUE permite ao PE “convidar” mas não “obrigar” a Comissão a iniciar um processo legislativo numa determinada área.
Em sede de alteração dos Tratados, o LIVRE defenderá que seja revisto o artigo 294º do TFUE, alargando o poder de co-decisão do PE a todos os atos legais da União, sem exceções, e possibilitando o início do processo legislativo no Parlamento Europeu. O LIVRE defende também, no quadro de possíveis acordos inter-institucionais que não requeiram mudança dos Tratados, a necessidade de reinterpretar o artigo 224º do TFUE, dando ao PE a faculdade de transpor em propostas políticas os pedidos dos cidadãos europeus que representa.
4.3. Eleger os Representantes Permanentes dos Estados-membro no Conselho da UE
O Conselho é hoje a mais poderosa instituição da União Europeia e, no entanto, é também a menos transparente. O Conselho tem duas versões. A par do Conselho Europeu, que reúne periodicamente os chefes de estado e de governo democraticamente eleitos, no Conselho da UE somos representados por uma missão liderada por um diplomata de carreira. Para uma maior democratização da União Europeia, é necessário democratizar o Conselho da UE.
O LIVRE propõe que o chefe de missão de Portugal seja democraticamente eleito, tomando assim Portugal um papel na vanguarda do movimento renovador da União. Esta eleição, que depende apenas e só da vontade política de Portugal, deverá ser feita de forma democrática e transparente.
4.4. Forçar o Conselho Europeu à transparência
As reuniões do Conselho têm lugar, na sua maioria, à porta fechada. Os resultados das votações são mantidos secretos e grande parte das decisões importantes é preparada antecipadamente pelos embaixadores ou representantes permanentes dos estados-membro. Esta situação dá aos governos um grau de fechamento que já não têm sequer nos estados-membro e permite-lhes eximirem-se de responsabilidades quando as decisões se revelam erradas. Para além disso, esta situação não tem tornado a UE mais eficaz, nem as suas decisões mais corretas, como se viu na gestão da crise do Euro e, em particular, nas decisões que levaram ao fiasco cipriota.
O LIVRE é favorável a uma radical mudança de atitude nas instituições europeias, a começar pelo Conselho. Todas as votações devem ser tornadas públicas. No quadro de um acordo inter-institucional entre o Conselho, o Parlamento e a Comissão, as três instituições devem estabelecer regras comuns para a publicidade das suas reuniões e, para poupar gastos, encontrar um meio comum de difusão pública destas reuniões (a exemplo do C-SPAN norte-americano ou da TV Congresso brasileira).
4.5. Legislar a tempo e horas: acabar com o processo de co-indecisão
Segundo os Tratados da União Europeia, o Conselho e o Parlamento legislam através de um processo de co-decisão, sob proposta da Comissão Europeia. Como uma lei que saia do Parlamento Europeu não tem prazo para o Conselho responder, o Conselho utiliza o “veto de gaveta” para parar o processo legislativo, o que cria um processo de “co-indecisão”. Existem casos de co-decisões que ficam paradas no Conselho durante anos, mesmo quando se trata de decisões urgentes.
Acabar com o processo de co-indecisão, respeitando o mandato dado pelos cidadãos europeus ao Parlamento, é urgente e fácil. Para isso bastará um compromisso entre as instituições europeias de modo a estabelecer um prazo para o Conselho reagir a legislação vinda do Parlamento. No Parlamento Europeu, o LIVRE lutará por este compromisso.
4.6. Dar voz aos cidadãos nas propostas de legislação da Comissão
Há um verdadeiro escândalo no modo de trabalho da Comissão Europeia, única instituição da União que tem o direito de iniciar propostas legislativas: quase 80% dos parceiros consultados antes da tomada de decisões são oriundos do mundo empresarial e fazem parte sobretudo de grandes empresas e instituições financeiras. Esse é um mundo que os altos funcionários da Comissão conhecem bem: afinal, muitos deles vieram de lá e para lá voltarão depois de usarem as portas giratórias de Edifício Berlaymont, em Bruxelas, onde se situa a Comissão Europeia. Isto gera uma situação de câmara de eco, onde os interesses das grandes empresas só se ouvem a si mesmos ou a quem os compreende bem e escolhem entre si os seus sucessores, isto quando não preparam nos seus serviços jurídicos as propostas legislativas que virão depois fazer parte do acervo da União.
O acesso desigual aos decisores políticos e a falta de transparência no processo de consultas têm de acabar. Em primeiro lugar, de modo a assegurar uma participação equilibrada de interesses económicos, sociais e profissionais na tomada de decisões a nível da UE, é crucial reforçar o papel do Comité Económico e Social Europeu a montante e a jusante do processo legislativo. Em relação à questão da falta de transparência, é necessário dar sequência ao trabalho do Parlamento e da Comissão. As recomendações feitas na recente revisão do acordo inter-institucional — conhecido como Registo de Transparência — já consagram incentivos para o registo de representações de interesses. Mas para prevenir o acesso ilegítimo aos decisores políticos é necessário ir mais longe e estabelecer de uma vez por todas a obrigatoriedade de registo. Ao mesmo tempo, a Comissão deve fazer a sua parte. A publicação de todos os documentos recebidos fora dos mecanismos de consulta previstos, incluindo reuniões privadas, deve ser uma regra. Deve também ser vedada a participação da Comissão em eventos organizados por interesses não registados, impedindo a participação destas entidades em eventos organizados pela Comissão.
4.7. Avançar para um Senado Europeu com votos iguais para cada país
A União Europeia funciona hoje num sistema legislativo de duas câmaras, sendo o Conselho da União Europeia a segunda câmara e o Parlamento Europeu a primeira. Se o Parlamento Europeu representa os cidadãos da União Europeia, então o Conselho deve ser transformado num verdadeiro Senado Europeu, onde os estados-membro estejam representados de forma igualitária. Um Senado Europeu democraticamente eleito trará valor acrescentado à construção da democracia Europeia.
Em sede de revisão dos Tratados da União Europeia, o LIVRE defenderá a substituição do Conselho da União Europeia por um Senado eleito, com um número igual de senadores por cada estado-membro, que constitua uma segunda câmara do Parlamento Europeu.
4.8. Acabar com o circo Bruxelas-Estrasburgo
Todos os meses, e apenas por quatro dias, todo o Parlamento Europeu passa de Bruxelas, na Bélgica, para Estrasburgo, em França. Este movimento mensal de milhares de pessoas custa 180 milhões de euros por ano aos contribuintes europeus e produz quase 20 mil toneladas de CO2 por mês. A maioria dos eurodeputados, por variadas ocasiões, votou para que o Parlamento Europeu possa decidir ter uma sede única. No entanto, os governos dos estados-membro bloqueiam sempre esta decisão.
Eleitos para o Parlamento Europeu, os eurodeputados do LIVRE irão trabalhar por uma maior eficiência, exigindo que se acabe com a plurilocalização do Parlamento Europeu, dando-lhe uma sede única e lógica — em Bruxelas.
4.9. Garantir a representação dos jovens
Em Portugal foi recentemente aprovada a entrada do Conselho Nacional de Juventude no Conselho Económico e Social, de modo a que os jovens tenham uma palavra na definição de políticas que os afetem diretamente, tal como têm sindicatos e entidades patronais. Ao nível europeu isto também deverá acontecer, através do Comité Económico e Social Europeu, órgão consultivo da União Europeia. A União Europeia deve ainda garantir a existência de Conselhos de Juventude em todos os países da União, enquanto órgãos independentes e representativos com poder de avaliação de políticas públicas que afetem a juventude.
O LIVRE irá defender a inclusão de representantes designados pelo Conselho de Juventude, de cada representação nacional, no Conselho Económico e Social Europeu, para que os jovens acompanhem e intervenham nas políticas europeias.
4.10. Fazer da UE o motor do combate às desigualdades mundiais
A UE é o maior doador mundial, mas a ajuda continua insuficiente e ineficaz, mantendo-se oligarquias corruptas que exploram recursos e populações sem acesso a saúde e educação.
O LIVRE pode defender no PE um modelo de ação integrada onde comissões do PE, da Direção Geral do Desenvolvimento e Cooperação da Comissão e do Conselho dos Negócios Estrangeiros desenvolverão uma iniciativa comum, guiada por objetivos concretos e por projetos e não apenas por quantias monetárias. Esta iniciativa deve preocupar-se com construção de infra-estruturas de saúde, educação, comunicações. Só assim será possível erguer verdadeiras democracias e libertar estes países da caridade externa que se perpetua. Resolvidos estes problemas, que conduzem a outros (guerras civis, crises de refugiados), a UE poderia canalizar os fundos de hoje para projetos de parceria com esses países.
4.11. Acabar com a subversão do processo democrático através da compra de votos
Um importante partido alemão recebeu recentemente uma doação de 700.000€ por parte dos maiores acionistas de uma grande construtora automóvel. Na ausência de limites máximos para doações políticas a partidos neste país, estas doações são legais — mas vale a pena notar que elas surgem pouco depois de a Alemanha ter conseguido diminuir o alcance da legislação europeia quanto às emissões dos automóveis. Este não é mais do que um mero exemplo da forma como o dinheiro pode distorcer o processo democrático, lesando o bem comum, a justiça e a confiança nas instituições democráticas. Combater a corrupção sistémica é fundamental.
O LIVRE subscreve as recomendações da “Transparency International”, segundo as quais deverão existir “regras mínimas” na UE no que diz respeito ao financiamento dos partidos, desde tetos máximos para doações, até garantias de transparência na prestação de contas, bem como sanções eficazes e adequadas em caso de prevaricação.
4.12. Impor uma cláusula anti lavagem de dinheiro em todos os acordos comerciais com países terceiros
A lavagem de dinheiro, ou branqueamento de capitais, atinge 2,7% do PIB mundial. Este flagelo tem sido tido em conta nos recentes quadros de orientações internacionais, mas as zonas cinzentas ainda são muitas. Nacionalmente, o Banco de Portugal aplicou algumas das regras do BCE mas os critérios ainda são sobretudo qualitativos (como definir as operações que podem ser consideradas suspeitas) e não tanto quantitativos, ou seja fixar um valor a partir do qual deve ser comunicada a operação ao Ministério Público. Ao nível das transações bancárias entre os estados-membro, as zonas cinzentas são ainda maiores porque não existem normas homogéneas relativamente aos depósitos em contas correntes bancárias; compra de produtos e serviços financeiros, como títulos de capitalização, previdência privada e seguros; aplicações em depósitos a prazo, poupança, fundos de investimento e compra de bens, como imóveis, ouro, pedras preciosas, obras de arte.
O LIVRE propõe uma cláusula anti branqueamento de capitais em todos os acordos comerciais com países terceiros, que tenha em consideração medidas qualitativas e quantitativas para a transação de capitais. O não cumprimento integral desta cláusula levará a sanções e processos-crime perante o BCE e os Ministérios Públicos de cada país. O LIVRE é favorável à implementação imediata de auditorias internas sobre o branqueamento de capitais em cada banco, que responda perante este crime quer à sua administração, quer aos bancos centrais, quer ao BCE.
4.13. Escrever os próximos capítulos da democracia no mundo: por uma Assembleia Parlamentar das Nações Unidas
As nações do mundo têm representação; os cidadãos do mundo, não. É comum dizer-se que a Organização das Nações Unidas, nascida do fim da IIª Guerra Mundial, precisa de se atualizar. Algumas das potências emergentes querem ter um lugar permanente à mesa do Conselho de Segurança da ONU. As reivindicações de todos os estados do mundo encontram o seu lugar na Assembleia Geral, onde os nossos países são representados pelos seus governos ou diplomatas. Não há, contudo, nenhum fórum que represente os cidadãos — e este tem sido o argumento central da campanha global para uma Assembleia Parlamentar das Nações Unidas.
O LIVRE defende que o Parlamento Europeu deve estar na linha da frente da campanha internacional pela fundação de uma Assembleia Parlamentar das Nações Unidas, que dê voz aos eleitores de todo o mundo através dos seus representantes eleitos. O próprio Parlamento Europeu nasceu como assembleia parlamentar eleita indiretamente e é hoje o único parlamento transnacional completamente eleito do mundo (o Parlamento do Mercosul passará a ser parcialmente eleito nos próximos anos). Promover a ideia de uma Assembleia Parlamentar global que acompanhe a Assembleia-Geral das Nações Unidas é uma expressão prática de uma ideia que está no cerne da atitude europeia do LIVRE, que recusa qualquer ideia de superioridade europeia ou competição global entre regiões do mundo, mas vê a superação das rivalidades entre nações como um progresso a ser defendido e expandido todos os dias, na Europa e no mundo, onde quer que esse progresso esteja novamente a ser posto em causa.