No Dia Internacional da Vida Selvagem, o LIVRE reforça a necessidade de travar e reverter o declínio da biodiversidade. É essencial proteger a Reserva Natural do Estuário do Tejo, combater o tráfico de animais selvagens e reforçar os meios das entidades responsáveis pela proteção da vida selvagem.
Ao assinalar-se o Dia Internacional da Vida Selvagem, o LIVRE vem reforçar a necessidade de agir urgentemente para travar e reverter o declínio da biodiversidade à escala global, na União Europeia e em Portugal, reconhecendo a importância fundamental que a vida selvagem tem para o equilíbrio ecológico do planeta e exigindo das autoridades nacionais um empenhamento efetivo na sua proteção.
A 5ª edição das Perspectivas Mundiais sobre a Biodiversidade, publicada recentemente pelo Secretariado da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) da Organização das Nações Unidas (ONU), não podia ter sido mais clara: perdemos mais uma década na luta pela salvaguarda do nosso futuro. A maioria das metas globais lançadas há 10 anos atrás, a partir da cidade de Aichi, no Japão, não foi alcançada.
O fracasso ou a ausência de genuína ambição para resolver a situação difícil que a vida selvagem mundial enfrenta, são evidentes e para o comprovar continuam a ser publicados relatórios que o ilustram. O mais recente relatório da organização WWF sobre a vida no nosso planeta, por exemplo, registou um declínio de 68% nas populações selvagens de mamíferos, aves, anfíbios, répteis e peixes, nestes últimos quase 50 anos. Não deixando de variar de região para região, estes declínios conduzem-nos à extinção das espécies e trazem consigo o colapso dos ecossistemas, dos ciclos de nutrientes e da água e da capacidade que o planeta tem para nos alimentar e providenciar ar respirável.
Como se a sobrevivência dos seres vivos na Terra – incluindo a nossa – não fosse desde logo a mais crucial razão para agirmos, o relatório encomendado pelo governo do Reino Unido ao reputado economista Partha Dasgupta, sobre o impacto do declínio da biodiversidade, publicado já em 2021, é também claríssimo: estamos a ultrapassar pontos-de-não-retorno com consequências súbitas e devastadoras relativamente às quais as novas doenças infecciosas, que emergem da transformação e exploração de florestas nativas e espécies selvagens, como a COVID-19, podem ser apenas a ponta do iceberg.
À escala global, o que é preciso fazer é claro também: desde transformar a forma como a economia global funciona, eliminando por exemplo os cerca de 3 a 5 milhões de milhões de euros atribuídos todos anos como subsídio a actividades prejudiciais à natureza, até melhorar os nossos próprios hábitos de consumo – procurando conhecer a origem e a forma como são produzidos os produtos que compramos e escolhendo selectivamente aqueles que são certificadamente sustentáveis e não resultam na destruição de habitats e ecossistemas.
Na União Europeia (UE), há passos fundamentais a tomar. No semestre em que Portugal assume a Presidência do Conselho da UE, o LIVRE desafia o governo português a agilizar ambiciosamente a implementação da Estratégia da UE em matéria de Biodiversidade, rumo a 2030, e de todas as medidas do Pacto Ecológico Europeu relevantes para a vida selvagem.
Tendo em conta o elevado impacto negativo que a agricultura intensiva, dependente do uso excessivo de fertilizantes e pesticidas, continua a ter na vida selvagem europeia, o LIVRE desafia o governo português a assegurar a justa transposição da estratégia proposta pela Comissão Europeia para agir em toda a fileira alimentar – “do Prado ao Prato” – no âmbito da negociação dos Planos Estratégicos que cada Estado-membro está agora a preparar para mais 7 anos de Política Agrícola Comum (PAC). Sabemos que a Presidência Portuguesa da UE está a defender a alocação mais baixa de verbas do 1º Pilar para incentivar os agricultores a adoptar boas práticas face ao ambiente – 20%. O LIVRE subscreve a proposta do Parlamento Europeu: no mínimo, 30%.
À escala nacional, o LIVRE reivindica também acção urgente por parte do governo português. Segundo dados de 2019 da União Internacional para a Conservação da Natureza, Portugal é o quarto país da Europa com mais espécies selvagens em risco de extinção e, apesar da legislação nacional que protege espécies ameaçadas, nada se tem feito para efectivamente acabar com situações como a do abate recente de dois lobos-ibéricos, através de armadilha ilegal ou o abate frequente de inúmeras aves, com destaque para as rapinas, que, de modo deliberado ou por negligência, são vítimas de envenenamento, todos os anos.
Com efeito, num ano em que se realizará a 15ª Conferência das Partes (COP) da CDB – um ano em que a diversidade da vida selvagem deveria ser celebrada e os compromissos assumidos respeitados – o LIVRE não pode também deixar de condenar a insistência na construção de um novo aeroporto na área de influência da Reserva Natural do Estuário do Tejo. Nenhuma das três opções agora anunciadas para a Avaliação Ambiental Estratégica poupará o estuário e os habitats e as vidas de muitas aves que ali habitam ou repousam no seu movimento migratório, nem a opção da não construção tem sido sequer contemplada.
O LIVRE desafia ainda o governo português a priorizar o desenvolvimento de um novo plano de combate ao tráfico de animais selvagens na União Europeia, uma vez que o anterior terminou o ano passado. Esta ação seria um contributo significativo para a manutenção da vida selvagem e para o reconhecimento do enorme valor que a mesma detém.
A recente chacina na Herdade da Torre Bela evidenciou também a urgência de olharmos para a vida dos muitos animais que ali foram mortos não apenas numa perspetiva utilitária – neste caso o seu potencial económico enquanto espécie cinegética – mas também pelo valor intrínseco que possuem. Neste caso concreto, o LIVRE considera imperativo que, tal como o governo português prometeu, se esclareçam as condições em que os animais foram mortos, se punam os responsáveis, e se avancem medidas que impeçam que situações desse tipo voltem a ocorrer. Infelizmente, tal não parece estar a ser conduzido com a transparência devida e prometida, uma vez que o procedimento relativo ao projeto para a instalação de centrais fotovoltaicas na área de Torre Bela, e que se encontrava suspenso desde a chacina dos animais, voltou a consulta pública sem que tenham sido tornadas públicas informações relevantes sobre o assunto.
Finalmente, o LIVRE considera ainda prioritário que as entidades nacionais responsáveis pela proteção da vida selvagem em Portugal, como o Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) e o Serviço de Proteção da Natureza e Ambiente (SEPNA) da GNR, disponham de meios humanos e materiais que lhes permitam desenvolver eficazmente o seu trabalho, nomeadamente a vigilância e fiscalização do cumprimento da lei. É também urgente que o ICNF passe a dispor de informação atualizada e fidedigna sobre os efetivos das populações selvagens do país, as suas condições de existência e causas de morte, com destaque para as espécies protegidas. Por outro lado, é necessário que, nos casos em que espécies selvagens, como o lobo, resultem na morte de animais de rebanhos devidamente pastoreados, que o Estado pague atempadamente as indemnizações previstas por lei e que implemente medidas que reduzam a predação de animais domésticos e minimizem prejuízos económicos. A recuperação da utilização de cães de gado é um exemplo do tipo de medidas que deve ser incentivado e apoiado.