Medidas de combate à inflação: demasiado pouco e demasiado tarde

Medidas de combate à inflação: demasiado pouco e demasiado tarde

O LIVRE considera que as medidas ontem apresentadas pelo Governo são um apoio insuficiente e tardio.

A adequação ao contexto português de medidas que têm sido implementadas nos últimos meses noutros países demonstra falta de coragem política e sentido de urgência por parte do governo. A situação que vivemos não é apenas conjuntural e além de medidas contracíclicas necessita de programas mais ambiciosos no combate à pobreza e às desigualdades sociais.

Medidas como a redução do IVA da electricidade para 6% nos consumos até 100 kWh, mantendo a taxa de 23% para consumo acima desse valor, colocam o limiar de apoio abaixo do consumo médio doméstico típico em Portugal num momento em que os encargos com a energia continuam a aumentar para famílias e empresas.  A redução da taxa de IVA para 6% no consumo e fornecimento de eletricidade e gás, já proposta pelo LIVRE, impunha-se sem qualquer limitação.

De notar também a total ausência neste pacote de medidas para o aprofundamento da transição energética e de uso dos transportes públicos.

Por outro lado, sobre uma parte da população especialmente vulnerável à perda de poder de compra, os pensionistas, as contas do Governo estão certas: os pensionistas terão recebido exatamente o mesmo em dezembro do próximo ano com ou sem esta medida. No entanto, o Governo não clarificou até ao momento se esta medida terá influência nas atualizações futuras do valor das pensões, o que poderá prejudicar muitos pensionistas nesta atualização já em 2024.

O apoio à população activa com rendimentos brutos até 37.800,00 euros anuais (ou 2.700,00 euros mensais, em média) e aos dependentes com idade inferior a 24 anos independentemente do rendimento do agregado assinala o reconhecimento da parte do Governo da reposição de rendimentos como medida de mitigação dos efeitos da inflação. Contudo, a desadequação da abrangência e dimensão face à gravidade da atual situação demonstra, uma vez mais, a pertinência em implementar um Rendimento Básico Incondicional, uma medida de alcance universal em que a transferência seria posteriormente sujeita a taxação em sede de IRS como forma de tornar o mecanismo redistributivo, por um lado, e parcialmente auto-financiado, por outro. 

O LIVRE considera o limite de 2% para o aumento das rendas habitacionais e comerciais uma medida positiva. Só desta forma é possível a estabilidade económica para empresas, famílias e proprietários. Com as famílias cada vez com maiores dificuldades no pagamento das suas despesas devido à inflação e tendo em conta os valores elevados do custo da habitação, um aumento das rendas de 5,43% poderia contribuir para um número maior de incumprimentos e instabilidade habitacional. Para além da aplicação automática em sede de IRS, aguardamos por maior detalhe de como o Governo estabelecerá a medida de compensação aos proprietários.

O LIVRE continua a defender a taxação dos lucros extraordinários e excessivos de alguns setores de atividade, uma fonte de receita que poderia ser usada para financiar as medidas urgentes e necessárias de apoio às famílias e empresas que defendemos. Não só do ponto de vista da justiça social, mas também da perspectiva da responsabilidade económica, não é compreensível a relutância em exigir das empresas que têm lucrado com a guerra na Europa uma contribuição também ela extraordinária que permitisse apoiar mais as famílias e pequenas e médias empresas de outros setores gravemente afetados, evitando perdas maiores do poder de compra, com efeitos diretos na economia real. 

Salientamos ainda a ausência de um compromisso adicional no salário mínimo nacional. O Governo diz que o mundo mudou a 24 de fevereiro, mas ainda propõe o mesmo salário mínimo nacional que propunha a 30 de janeiro deste ano. O valor de referência é agora mais curto e obriga muitos trabalhadores a um esforço adicional. O apoio pontual avançado fará certamente a diferença para muitas famílias mas é importante manter a rota de crescimento do SMN fazendo a sua evolução acompanhar o crescimento da economia. Os indicadores da atividade económica, nomeadamente os números do desemprego, apontam para um mercado laboral capaz de acomodar essa evolução, tal como aconteceu noutros momentos. 

Esta é uma inflação semelhante à dos anos 30 e 40 do século passado e essa inflação foi combatida e debelada por políticos corajosos; com apoios à produção e à oferta, novas políticas públicas tendencialmente baratas ou até gratuitas, e com programas inovadores. É isso que o LIVRE defende, e continuará a defender. Daqui até ao próximo orçamento, apresentaremos novas propostas de mitigação da perda de poder de compra e reposição de rendimentos bem como iniciativas de incentivo à redução da dependência dos combustíveis fósseis e de apoio às pequenas e médias empresas.

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