Ontem, ao discursar na sede de campanha do LIVRE, improvisando perante tanta gente que ainda há poucos meses não imaginava que iria fazer um partido junta, saiu-me uma frase em que não tinha pensado antes, mas que está na essência do nosso projeto político: “peço-vos que nunca digamos uma palavra em que não acreditemos”.
O projeto do LIVRE está em trazer conteúdo à política e significado a algumas palavras que foram esvaziadas pela política sem conteúdo. Há palavras que só ganham vida se estivermos dispostos a agir por elas. E, nos últimos anos, demasiadas palavras foram esvaziadas. Não basta falar de democracia, é preciso praticá-la — e por isso fizemos primárias abertas. Não basta falar de mudança, é preciso ser a mudança — e por isso usamos a democracia deliberativa como método. Não basta falar de Europa — é preciso explicar o que fazer com ela, e por isso temos o programa mais completo e bem fundamentado destas eleições.
O objetivo é ter uma política que deixe de tratar os cidadãos como se eles tivessem uma mera câmara de eco no lugar da cabeça. E aventura só agora começou. Há tantas palavras a preencher de significado nos dias de hoje. Há quem fale de patriotismo, sem estar disposto a modificar a sua tática partidária quando o país está em risco. Há quem fale de europeísmo, quando viu a pior crise abater-se sobre a Europa e não levantou a sua voz contra a política de vistas curtas que nos dominou. Há quem fale de esquerda, e recuse admitir que a esquerda será sempre uma aliança de diferentes — de todos os que não são ricos nem poderosos — cujo objetivo é mudar o mundo presente, e não digladiar-se em disputas bizantinas sobre quem é mais puro no reino dos céus.
Nós não podemos continuar a esperar que o significado desça sobre estas palavras como quem reza pela chuva. Temos de ser nós a fazer algo por estas palavras: solidariedade, justiça, progresso, futuro, liberdade. Temos uma responsabilidade perante elas, que é uma responsabilidade perante nós mesmos e os nossos concidadãos. Queremos viver numa política em que haja correspondência entre o que se diz e o que se faz. E, por uma vez, basta querer para se começar a fazer.
Nestas semanas explicámos o “porquê” do LIVRE — porque era necessário um partido mais aberto, mais democrático, mais libertário, com uma voz autónoma para a ecologia, no meio da esquerda portuguesa. Para logo depois explicar o “para quê”: para que serve votar no LIVRE, eleger deputados e deputadas que implementarão o nosso programa legislativo, e fazer do LIVRE uma surpresa que tenha impacto na formação de governo em Portugal.
E ontem juntámos ao “porquê” e ao “para quê”, mais duas palavras: o “contra” e o “como”.
O “contra” é uma palavra muito importante. Não se pode viver sem recusar, não se pode ser pessoa sem poder dizer não, sem desobedecer. Mas cada “contra” encerra em si uma responsabilidade política: a do “como”. Não se pode estar contra sem ao menos tentar procurar um “como”: como sair da situação em que nós encontramos, como combater o que nos aflige, como reformular as regras do jogo, como ser a mudança que queremos fazer.
Tenho muito orgulho de estar num partido que a cada momento leva a sério essas palavras: porquê, para quê, contra, como. Temos brio em explicar claramente o que queremos fazer com cada uma delas.
Agora chegámos ao início da aventura. Vamos pela primeira vez apresentar-nos ao voto dos nossos concidadãos, com um sorriso estampado na cara. Nós não acreditamos só na democracia; gostamos dela. Vamos contentes ao encontro dela. Estamos contentes porque fizemos uma campanha digna, porque falámos do futuro e da Europa (e de Portugal nela), porque não nos deixámos desviar do nosso caminho, porque não fizemos um único ataque pessoal, não caímos numa única controvérsia artificial ou inflacionada, não perdemos um segundo com aquilo que não interessava. Ao invés de jogar para a agenda mediática das próximas 24 horas, pensámos e falámos sempre dos próximos 5 anos.
E agora falta uma hora para fechar a campanha. É a hora dos últimos telefonemas, dos últimos panfletos, dos últimos argumentos. Estamos bem perto de conseguir mudar a política portuguesa. Falem com toda a gente que puderem nestes minutos. Expliquem o que é este partido, o que ele pode fazer, como ele pode melhorar a democracia, como os seus deputados e deputadas no PE legislarão para mudar a Europa. Persuadam muitos, convençam todos os que puderem.
Só vos peço uma coisa: que nunca digam uma palavra em que não acreditem.
Rui Tavares, cabeça de lista do LIVRE