A falta de acessibilidade nos transportes públicos tem sido uma das principais causas de exclusão e discriminação das pessoas com deficiência e incapacidades. O vereador Carlos Teixeira apresentou uma proposta do LIVRE, no passado dia 25 de outubro, na reunião pública da Câmara Municipal de Lisboa, que identifica dificuldades de mobilidade e expõe soluções.
Vê aqui a intervenção:
Melhor acessibilidade nos transportes públicos e na cidade
Não há sociedade verdadeiramente inclusiva e igual em oportunidades enquanto existirem pessoas que não podem exercer a sua cidadania com o pleno direito de ir e vir, devido às dificuldades e barreiras encontradas no acesso aos serviços de transportes públicos. O art.º 3º, al. b) da Lei nº 46/2006, de 28 de agosto, define «discriminação indireta» como a que ocorre sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutra possa colocar pessoas com deficiência em posição de desvantagem.
De facto, a falta de acessibilidade nos transportes públicos tem sido uma das principais causas de exclusão, discriminação e negação de direitos fundamentais das pessoas com deficiência e incapacidades na Área Metropolitana de Lisboa. De acordo com os Censos de 2021, entre a população residente com 15 ou mais anos de idade, cerca de 618 mil pessoas têm alguma dificuldade de visão, cerca de 264 mil pessoas apresentam alguma dificuldade auditiva e quase 345 mil pessoas têm dificuldade em andar ou subir degraus. É, assim, crucial que a CARRIS possa constituir-se um exemplo nesta matéria em Lisboa e na Área Metropolitana e também para o país e outras operadoras que prestem serviços de transporte público.
Considerando que:
- Uma rede de transporte público eficaz e que potencie o direito à liberdade de circulação é uma preocupação constitucional, como dita o art.º 65.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), bem como nos termos do art.º 9º, alínea d), é responsabilidade do Estado a promoção do bem-estar e qualidade de vida, assim como a igualdade real entre portugueses e portuguesas, prevista no princípio da igualdade, n.º 1 do art.º 13º da CRP, que consagra a dignidade social e igualdade jurídica entre os cidadãos e cidadãs;
- Portugal é signatário da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, das Nações Unidas, adotada a 13 de dezembro de 2006 (resolução A/RES/61/106) e aberta à assinatura em Nova Iorque a 30 de março de 2007, e que a legislação doméstica na área da acessibilidade é relativamente profusa, por exemplo, o Decreto n.º 163/2006, de 8 de agosto, alterado pelo Decreto-Lei n.º 125/2017, de 4 de outubro; a Lei n.º 46/2006, de 28 de agosto, que proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência; a Lei n.º 4/2019, de 10 de janeiro; a Resolução do Conselho de Ministros n.º 119/2021, de 31 de agosto, que aprovou a Estratégia Nacional para a Inclusão das Pessoas com Deficiência 2021-2025; o Decreto-Lei n.º 82/2022, de 6 de dezembro, que transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva (UE) 2019/882 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de abril de 2019, entre outros diplomas;
- O Regime Jurídico das Autarquias Locais (RJAL) estabelece a transferência e delegação de competências do Estado para as autarquias locais, entidades intermunicipais e municípios, logo, constituem atribuições do município a promoção e salvaguarda dos interesses próprios das populações no domínio do transporte, nos termos do art.º 23º, n.º 2, al. c) da RJAL);
- Os municípios são simultaneamente o órgão de licenciamento e de supervisão da Lei de Acessibilidade a Espaços Públicos, Equipamentos Coletivos e Edifícios Públicos e Habitacionais (Decreto-Lei nº 163/2006) e, segundo as associações que trabalham diretamente com pessoas com deficiência e incapacidades, a aplicação das normas de acessibilidade tem sido problemática, visto a escassa e ineficaz supervisão do município de Lisboa na aplicação da lei;
- Nas paragens dos transportes públicos da CARRIS, a indisponibilidade de informação acessível e fácil de ler, assim como a ausência de um desenho do espaço urbano que elimine barreiras, tem comprometido a mobilidade das pessoas com deficiência ou incapacidade;
- Embora a Câmara Municipal de Lisboa tenha desenvolvido instrumentos que introduzem ou enquadram medidas que promovem uma mobilidade acessível, como o Plano de Acessibilidade Pedonal 2030, e 76% da frota da CARRIS esteja equipada para suprir algumas das necessidades dos passageiros com mobilidade reduzida, Lisboa não deve excluir nenhum dos seus habitantes da oportunidade de beneficiarem de um sistema de mobilidade acessível, eficiente e adaptado às suas necessidades;
- O Metropolitano de Lisboa tem modernizado, em algumas estações, as máquinas de validação dos passes para o canal de acesso às plataformas de embarque e as novas máquinas não dispõem de um sistema tátil e sonoro que possa auxiliar e facilitar o uso para as pessoas com deficiência visual, nem tem um sistema adaptado para aqueles e aquelas que não conseguem alcançar o topo das máquinas para validarem o acesso à plataforma, nomeadamente pessoas com deficiência motora, ou com nanismo;
- O LIVRE reuniu com a Associação Portuguesa de Deficientes (APD), a Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO) e com os profissionais da City Able, e considera importante que as recomendações feitas por estas entidades sejam implementadas na cidade de Lisboa e na Área Metropolitana de Lisboa para melhorar a mobilidade das pessoas com deficiência ou incapacidade;
Em face do exposto, tenho a honra de propor que a Câmara Municipal de Lisboa:
a) Promova serviços de transporte público ajustados às necessidades das pessoas com deficiência ou incapacidade através de adaptações do espaço público, nomeadamente nas paragens de autocarro, elétricos e ascensores, com a instalação de placas com horários, números das carreiras e os respetivos destinos, com letras em relevo e em braille, e que disponibilize informação sonora nos sistemas mais modernos. Do mesmo modo, que garanta que os passeios e vias de acesso às paragens cumpram as normas do Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto, na sua atual redação, o Plano de Acessibilidade Pedonal do Município de Lisboa, e sigam as boas práticas do Manual de Espaço Público, entre outros instrumentos orientadores;
b) Instale sinalizações sonoras nas paragens de autocarros, elétricos e ascensores, e que seja mantido o sistema de áudio nos autocarros da CARRIS em permanência durante a circulação;
c) Inste a CARRIS a equipar a sua frota com um sistema de som exterior que informe acerca do número da carreira e o destino quando os veículos se aproximarem da paragem;
d) Encoraje a Carris a modernizar a sua frota e, sempre que possível, adaptar os autocarros existentes para acomodar duas ou mais cadeiras de rodas, permitindo que múltiplas pessoas com mobilidade reduzida possam viajar em simultâneo;
e) Recomende ao Metropolitano de Lisboa que torne acessíveis as máquinas de validação dos passes no seu canal de acesso às plataformas de embarque, equipando-as com um piso tátil e informação sonora que informe sobre a abertura e fecho das portas e que considere adaptá-las para pessoas com deficiência motora ou nanismo, reforçando a necessidade de disponibilizar soluções que garantam o reconhecimento do lado a operar pelos canais de acesso especiais;
f) Recomende ao Metropolitano de Lisboa que equipe as escadas rolantes com sinal sonoro que informe sobre o sentido ascendente ou descendente; instale pontos de referência a informar onde estão as portas de saída do metro; instale um mapa tátil do espaço, colocado em pontos estratégicos nos principais locais de passagem; que seja nivelada a altura do piso entre o cais e o comboio nas plataformas de embarque, e seja sinalizada por indicação sonora e visual o número de carruagens em circulação;
g) Disponha, no espaço público, sinalização adequada das esplanadas autorizadas pelo município — um piso tátil ou estrado — de forma a sinalizar os obstáculos que são previsíveis nos passeios em frente aos estabelecimentos de restauração;
h) Faça o levantamento de todos os pontos de acesso à rede de transportes que são neste momento inacessíveis a pessoas com mobilidade reduzida, como por exemplo, postaletes afixados no meio dos passeios estreitos que não permitem a passagem de cadeiras de rodas ou carrinhos de bebés, a fim de proceder à sua correção e melhoria;
i) Promova o reforço dos recursos humanos especializados em acessibilidade, de forma a garantir a eficaz supervisão da implementação destas e outras medidas que dizem respeito à acessibilidade de pessoas com deficiência ou incapacidade na cidade e na Área Metropolitana de Lisboa.