Lisboa: Proposta sobre bem-estar animal na Câmara Municipal

Lisboa: Proposta sobre bem-estar animal na Câmara Municipal

Na reunião pública da Câmara Municipal de Lisboa, que decorreu a 28 de junho, o vereador Carlos Teixeira apresentou uma proposta do LIVRE para a criação de um regulamento do Bem-Estar Animal em Lisboa. Lisboa precisa de um regulamento que reconheça o direito dos animais à existência, ao respeito, bem como à proteção contra os maus-tratos. Criar este regulamento é essencial para assegurar o bem-estar animal na cidade.

Vê aqui a intervenção:

CRIAÇÃO DE UM REGULAMENTO DO BEM-ESTAR ANIMAL DO MUNICIPIO DE LISBOA

Considerando que:

I) A garantia do bem-estar dos animais que partilham connosco a cidade e o planeta tem sido um objetivo cada vez mais assumido pela nossa sociedade.

II) A 27 de janeiro de 1978 a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura) proclamou a “Declaração Universal dos Direitos dos Animais”.

III) Esta declaração reconhece a cada animal o direito à existência e ao respeito, bem como à proteção contra maus-tratos.

IV) Este reconhecimento não abrange apenas animais de companhia, mas todos os animais.

V) A nível europeu, o artigo 13.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia estabelece que “na definição e aplicação das políticas da União nos domínios da agricultura, da pesca, dos transportes, do mercado interno, da investigação e desenvolvimento tecnológico e do espaço, a União e os Estados-Membros terão plenamente em conta as exigências em matéria de bem-estar dos animais, enquanto seres sensíveis”.

VI) Também a nível nacional, a Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, que incide sobre a proteção aos animais, proíbe atos diversos “todas as violências injustificadas contra animais”, e estabelece o dever de socorrer “animais doentes, feridos ou em perigo”, bem como a necessidade de implementar medidas de proteção das espécies de animais em perigo de extinção, e que tem vindo a ser sucessivamente atualizada com disposições que incidem também sobre a atuação das câmaras municipais.

VII) A Lei n.º 69/2014, de 29 de Agosto, criminaliza os maus-tratos a animais de companhia, alargando os direitos das associações zoófilas.

VIII) A Lei n.º 110/2015 de 26 de agosto, estabelece o quadro de penas acessórias aplicáveis aos crimes contra animais de companhia.

IX) A Lei nº 8/2017, de 3 de março, veio estabelecer um novo Estatuto Jurídico dos Animais, inserindo esse Estatuto no Código Civil, cujo artigo 201º-C passou a determinar que “a proteção jurídica dos animais opera por via das disposições do presente código e de legislação especial”.

X) A legislação nesta matéria tem, portanto, beneficiado de avanços significativos nos últimos anos, nomeadamente em matéria de proteção legal contra maus-tratos, regulamentação de atividades diversas que envolvem de alguma maneira a presença de animais de espécies variadas, adoção de práticas mais dignificantes no controlo populacional de espécies variadas, recolha, esterilização e promoção da adoção de animais de companhia, adoção de métodos preventivos como os pombais contracetivos, entre outras boas práticas dirigidas a espécies domésticas ou selvagens.

XI) O Decreto Regulamentar n.º 3/2021, de 25 de junho, veio criar, à escala nacional, o Provedor do Animal –órgão singular, dotado de plena isenção e autonomia administrativa com a missão de garantir a defesa e a promoção do bem-estar animal.

XII) Em 2013, a cidade de Lisboa foi pioneira nesta matéria, sendo uma das primeiras cidades portuguesas a criar, à escala municipal, uma Provedoria dos Animais, instituição que tem por missão “garantir a defesa, o bem-estar e a proteção dos animais, bem como promover, zelar e monitorizar a prossecução dos seus direitos e interesses mediante queixa, reclamação devidamente identificada ou por iniciativa própria, relativamente a fatos que justifiquem a sua intervenção”.

XIII) Nos últimos anos, uma sucessão de municípios portugueses, liderados por executivos com diversas proveniências ideológicas, têm acompanhado a mudança de paradigma jurídico, e dado resposta aos apelos da sociedade, condensando toda a matéria regulamentar que diga respeito aos Direitos dos Animais num só instrumento jurídico, aprovando regulamentos que incidem sobre a saúde, qualidade de vida e bem-estar animal, bem como sobre aspetos de higiene, segurança e ordem pública, favoráveis a animais e pessoas, e à relação harmoniosa entre estes.

XIV) Estes instrumentos permitem reconhecer e tratar de forma mais eficaz todas as questões relativas à relação da cidade com os animais que nela habitam, sejam estes animais de companhia, com ou sem tutela, integrados ou assilvestrados, bem como animais de outras espécies domésticas ou selvagens, que ocorram na cidade.

XV) A diversidade de questões que podem ser abordadas num regulamento desta natureza incluem a proteção geral, as disposições a respeitar pelos detentores, a existência de Centros de Atendimento Médico-veterinários, os procedimentos a adotar com os animais sem tutela ou assilvestrados, a gestão de equipamentos como a Casa dos Animais de Lisboa ou os pombais contracetivos, o comércio de animais de companhia, as disposições relacionadas com animais provenientes de atividade pecuária ou outras atividades económicas, a detenção de espécies exóticas e/ou invasoras, o controlo populacional em espaço público, a fiscalização, o regime contraordenacional, entre outras.

XVI) A título de exemplo, destaca-se a existência de regulamentos que incidem sobre o bem-estar dos animais, nos seguintes municípios:

  1. Cascais aprovou em março de 2011 um Regulamento Municipal de Bem-Estar e Saúde Animal;
  2. Loulé aprovou em outubro de 2015 um Regulamento dos Direitos dos Animais do Município de Loulé;
  3. Setúbal aprovou em junho de 2020 um Regulamento de Saúde e Bem-estar Animal;
  4. Amares aprovou em maio de 2021 um Regulamento de Saúde e Bem-estar Animal do Municípios de Amares;
  5. Montijo aprovou em fevereiro de 2022 um Regulamento Municipal do Animal do Município do Montijo;
  6. Mais recentemente, em março de 2023 Braga aprovou o Regulamento de Bem-estar animal do Município de Braga.

XVII) Neste contexto, existe já em Portugal um histórico da aprovação deste tipo de regulamentos, facilitando a aprovação destas normais e tornando-as mais compreensíveis para os cidadãos.

XVIII) Este é pois, o momento para a cidade de Lisboa, capital de Portugal, passar a contar também com um Regulamento do Bem-estar animal, que acompanhe a mudança do paradigma jurídico associado aos Direitos dos Animais, dê resposta aos apelos legítimos dos munícipes quanto a esta questão civilizacional, proteja os animais face a maus-tratos, afirme o seu direito à vida, integridade física, psicológica e mental, reconheça a sua dignidade, e ajude a harmonizar, para benefício de todos, a coexistência entre os munícipes e a diversidade animal existente em Lisboa.

XIX) Este regulamento deve reconhecer direitos aos animais e obrigações tanto aos seus detentores como aos serviços municipais correspondentes, no sentido da garantia do seu bem-estar, bem como garantir o equilíbrio ecológico e a biodiversidade da cidade de Lisboa.

Em face do exposto, o Vereador do LIVRE tem a honra de propor que a Câmara Municipal de Lisboa delibere:

  1. Iniciar o processo de criação de um Regulamento do Bem-estar Animal da Cidade de Lisboa, dando instruções aos serviços municipais nesse sentido;
  2. Promover a realização de um amplo debate na cidade sobre os temas ligados ao Bem-estar Animal como fórum preparatório da redação do referido regulamento;
  3. Promover, no âmbito da redação do regulamento, uma auscultação alargada a todos os interessados no tema, nomeadamente Juntas de Freguesia, forças policiais, Serviços do Ministério Público, Capitania do Porto de Lisboa e as associações de defesa dos animais a operar na cidade de Lisboa bem como quaisquer outros parceiros relevantes.

 

Lisboa, 28 de junho de 2023.

O Vereador

Rui Tavares

 

Foto: Krista Mangulsone no Unsplash