Projeto de Voto de Condenação
Pelas agressões por um grupo de extrema-direita a Adérito Lopes e a atores e atrizes da Companhia de Teatro A Barraca
Na passada terça-feira, dia 10 de junho, dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, um grupo de extrema-direita agrediu Adérito Lopes, ator da companhia de teatro A Barraca, em Lisboa, quando este entrava para um espetáculo, de entrada livre, em homenagem a Luís Vaz de Camões.
Segundo a diretora da companhia, Maria do Céu Guerra, por volta das 20h, “um grupo de neonazis com cartazes e programas” com várias frases xenófobas, começaram a provocar os atores e atrizes que iam chegando para o espetáculo. Depois de algumas provocações, Adérito Lopes foi violentamente agredido e teve de receber tratamento hospitalar, o que obrigou ao cancelamento do espetáculo.
O grupo de extrema-direita em causa, composto por cerca de três dezenas de pessoas, deixou ainda frases como “Portugal aos portuguezes” (sic) junto ao equipamento cultural, apelando à “remigração”, um conceito usado pela extrema-direita como eufemismo para limpeza étnica. O público que se deslocou à sala de espetáculos e lotou o equipamento cultural abandonou o espaço por volta das 22h e após a intervenção da Polícia de Segurança Pública, que deteve um dos agressores.
No dia em que se celebravam os 30 anos do assassinato de Alcindo Monteiro por forças de extrema-direita, este ataque deve ser motivo de condenação por todas as forças democráticas e pela Assembleia da República.
O LIVRE manifesta o seu profundo repúdio pelas manifestações racistas e xenófobas que tiveram lugar no dia 10 de junho e que têm vindo a acontecer com cada vez maior frequência, designadamente aproveitando a realização de momentos culturais, como apresentações de livros ou de espetáculos teatrais.
Assim, a Assembleia da República condena as provocações e agressões contra os atores e atrizes da companhia de teatro A Barraca, nomeadamente ao ator Adérito Lopes, e manifesta a sua solidariedade com todos os profissionais da cultura e cidadãos alvo destes ataques, cada vez mais frequentes, e apelando à tomada de medidas firmes e integradas que impossibilitem a repetição destas agressões.
Assembleia da República, 11 de junho de 2025
As Deputadas e os Deputados do LIVRE
Isabel Mendes Lopes
Filipa Pinto
Jorge Pinto
Paulo Muacho
Patrícia Gonçalves
Rui Tavares
Pergunta à Ministra da Administração Interna
Assunto: Atividade de grupos de extrema-direita em Portugal
Destinatário: Ministra da Administração Interna
No dia 10 de junho, um grupo de extrema-direita agrediu Adérito Lopes, ator da companhia de teatro “A Barraca”, em Lisboa, quando entrava para um espetáculo em homenagem a Luís Vaz de Camões. A par das agressões, os elementos do grupo exibiram cartazes e deixaram folhetos com frases xenófobas e provocaram os atores e atrizes que chegavam ao local.
No mesmo dia, o Encontro Nacional de Homenagem aos Combatentes ficou marcado por insultos racistas ao imã de Lisboa, por acusações de traição à pátria, e saudações nazis.
Já no dia 9 de junho, a Comunidade Islâmica de Lisboa tinha alertado para a propagação de discursos de ódio e de acusações infundadas contra pessoas muçulmanas e para os seus riscos.
Estes episódios fazem parte de um padrão crescente de ações intimidatórias e violentas levadas a cabo por grupos de extrema-direita em Portugal. Um levantamento feito pelo Público em novembro de 2024 dava conta de 21 casos tornados públicos desde junho de 2023, entre os quais se contam interrupções de eventos públicos (em particular, lançamentos de livros publicados por mulheres sobre temáticas LGBTQIA+) e a divulgação de listas de pessoas a visar pela sua atividade em defesa dos direitos das pessoas LGBTQIA+. As situações de intimidação e de violência têm-se repetido e tornado cada vez mais comuns desde então.
O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) 2024 refere que: “[n]o que concerne aos extremismos políticos, a extrema-direita portuguesa assinalou um acentuado dinamismo, tendo explorado amplamente os dois períodos eleitorais de 2023 para intensificar a realização de ações simbólicas, de protesto e de propaganda enquanto veículo para a difusão do seu ideário. A persistência e a visibilidade destas ações começam a enformar a narrativa pública contra minorias étnicas, religiosas ou sexuais de um certo grau de normalização e, em alguns casos, a servir de legitimação para atos de violência. A maior tração da extrema-direita em Portugal, está também intimamente relacionada com a difusão de conteúdos extremistas online, alcançando uma audiência diversificada do ponto de vista socioeconómico e geracional. Em particular, a propaganda online de matriz aceleracionista e terrorista, assente no apelo explícito à violência, tem conduzido à radicalização muito rápida de indivíduos cada vez mais jovens e, em alguns países europeus, à preparação e cometimento de ações violentas.”
A este respeito, foi recentemente reportado pela comunicação social que o grupo neonazi 1143 estará a utilizar jogos com armas de airsoft e armas com balas de plástico para promover treinos militares.
A propagação de discursos de ódio, de violência e de ações que limitam a liberdade dos cidadãos e a radicalização são inaceitáveis e contrárias aos valores fundamentais do Estado Português, exigindo ação urgente e estruturada por parte das autoridades e dos órgãos de soberania.
Assim, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis as Deputadas e os Deputados do LIVRE questionam a Ministra da Administração Interna:
1 – Que avaliação faz o Governo da ameaça à segurança e ao Estado de Direito decorrente da atividade de grupos de extrema-direita e dos riscos associados ao seu crescente impacto e organização?
2 – Que diligências encetou e/ou planeia encetar o Governo relativamente à crescente atividade e violência de grupos de extrema-direita e ao seu impacto no dia-a-dia dos cidadãos e das cidadãs?
3 – Que medidas irá o Governo adotar com vista a prevenir os efeitos dos discursos extremistas e processos de radicalização, designadamente junto de crianças e jovens?
4 – Está o Governo pronto para, à imagem do que tem sido feito noutros países, requerer ao Supremo Tribunal de Justiça a classificação destes grupos como organizações fascistas (Lei n.º 64/78, de 6 de outubro)?
As Deputadas e os Deputados
Isabel Mendes Lopes
Filipa Pinto
Jorge Pinto
Patrícia Gonçalves
Paulo Muacho
Rui Tavares
Assembleia da República, 11 de junho de 2025