Acerca da Recomendação “Pela Promoção da Saúde e do Conhecimento Científico a Nível Municipal”

Acerca da Recomendação “Pela Promoção da Saúde e do Conhecimento Científico a Nível Municipal”

Contexto

Foi com alguma surpresa e muita apreensão que vimos a nossa recomendação “Pela Promoção da Saúde e do Conhecimento Científico a Nível Municipal” rejeitada na reunião Ordinária da Assembleia Municipal de Lisboa no dia 12 de Novembro.

O documento apresentado para votação na Assembleia Municipal para constituir recomendação à Câmara Municipal de Lisboa apresentava um conjunto de 5 pontos deliberativos:

  1. Que fosse reconhecido o valor do conhecimento científico para a tomada de decisões informadas, sob orientação do modelo de Políticas baseadas na Ciência e na Evidência – tanto a nível da Saúde, da Educação ou da Ecologia;
  2. Que não fossem disponibilizadas consultas de homeopatia e medicina tradicional chinesa como complemento na área da saúde por parte de qualquer entidade municipal e que se terminassem as comparticipações existentes para estas práticas;
  3. Que a Câmara Municipal de Lisboa deixasse de promover de forma ativa eventos relacionados com este tipo de práticas;
  4. Que se criasse e promovesse uma “Feira Municipal” dedicada ao Conhecimento, incluindo a Ciência, a Medicina, a Tecnologia e a Inovação, numa estreita parceria entre o município, as Universidades, a Agência Nacional Ciência Viva, Empresas e Associações locais;
  5. Que se criassem campanhas de informação à população sobre as melhores práticas ao nível da Saúde.

 

Nos pontos 1., 4. e 5., PS, PAN, PSD e 2 deputados Independentes votaram contra. Bloco de Esquerda, PPM, MPT, CDS e 4 Deputados Independentes abstiveram-se. Para além de nós, PCP, PEV e 2 deputados independentes votaram a favor.

Nos pontos 2. e 3. PS, PSD, PAN e 4 deputados independentes votaram contra. CDS, PPM, MPT, PEV, Bloco de Esquerda abstiveram-se. Para além de nós, apenas o PCP e 3 deputados independentes votaram a favor.

 

O que está em causa

Os pontos 1., 4. e .5. pretendiam valorizar a importância do papel do conhecimento científico e técnico nas várias áreas da sociedade, incluindo na tomada de decisão política com base no melhor conhecimento disponível. Essa valorização do papel da Ciência, da Técnica e da Medicina refletir-se-ia em termos práticos através da promoção de iniciativas de divulgação pública como uma Feira Municipal do Conhecimento – organizada em colaboração com organizações reconhecidas pelo seu trabalho nesta área – e através de ações de sensibilização à população na área da Saúde.

Não compreendemos que a Autarquia Lisboeta dê aval positivo a um evento, como a Feira Alternativa, que tem no seu programa atividades que podem representar um risco para a saúde dos cidadãos, tais como como “óleos essenciais para curar o cancro”, “protocolos detox e sua importância na saúde”, “cromoterapia – o poder curativo da cor”, ou “Nova Medicina Germânica – Biodescodificação”, ou ainda outras atividades tão diversas e criativas como “encontro com os anjos”, “astrologia”, “regresso a vidas passadas”, “tarot”, “numerologia do inconsciente”, ou “ativação das 12 camadas do DNA”. É com enorme perplexidade que nos interrogamos como pode uma autarquia promover uma Feira Alternativa com as características descritas e simultaneamente ter uma Assembleia Municipal que chumba uma proposta para a realização de uma Feira de Ciência…

De modo coerente com os pontos anteriores, sugerimos nas propostas 2. e 3. que a Câmara de Lisboa não apoiasse consultas de homeopatia e de medicina tradicional chinesa, nem promovesse ativamente eventos relacionados com as mesmas. Ou seja, a nossa proposta é retirar apoio político a estas iniciativas e não acabar com este tipo de práticas ou impedir os munícipes a elas recorram por outros meios. Não estando em causa qualquer tipo de proibicionismo, entendemos que dar apoio institucional a estas Terapias é validar politicamente algo que não tem validade científica, levando os cidadãos ao engano.

Aos que escudaram a rejeição desta recomendação na justificação de que a OMS avaliza as “terapias alternativas”, como foi o caso do PS, que na sua intervenção afirmou “não pode ser sério que as Terapias Não Convencionais (TNCs) estejam ao mesmo nível dos movimentos anti-vacina ou dos movimentos negacionistas de alterações climáticas e que OMS recomenda algumas destas práticas como positivas”, recordamos que a OMS é uma instituição de carácter político que emite pareceres e dá indicações de atuação, mas que não faz investigação. Pelo contrário, são os institutos de investigação, universidades e hospitais que se dedicam à avaliação destas práticas que têm reiteradamente demonstrado que a evidência científica que suporta estas terapias é muito escassa. O que o deputado do PS não mencionou, talvez por desconhecimento, foi que esta decisão da OMS tem sido contestada ao longo dos últimos anos pela comunidade científica e que a tanto a homeopatia como a naturopatia recusam a vacinação, o que efectivamente faz delas promotoras do conhecido Movimento Anti-Vax, constituindo um risco não só para a saúde individual, mas sobretudo para a saúde pública.

Quanto ao deputado do PAN, regozijando-se na sua intervenção pela legalização das TNCs e afirmando que no “nosso país” os maus tratos a animais não são uma realidade neste âmbito (dependendo a Medicina Tradicional Chinesa da captura e morte de várias espécies para obter curas milagrosas, como pó de corno de rinoceronte ou partes do corpo de tigres, apenas para mencionar duas espécies icónicas), parece ignorar que esta é também uma questão nacional, uma vez que cavalos-marinhos estão a ser capturados em massa, levando à extinção das populações da Ria Formosa, no Algarve. Ficamos perplexos com a destreza e flexibilidade do PAN na sua capacidade de num momento alegar defender a causa animal e ambiental e, no seguinte, de defender práticas baseadas em misticismo que levam à extinção de populações animais. Concluímos deste debate que infelizmente o LIVRE é hoje o único partido que defende de facto a Ecologia e a conservação dos ecossistemas em Portugal.

 

Conclusão

Uma cidade como Lisboa, capital de um país desenvolvido no século XXI, deve promover a Ciência e o Conhecimento e não apoiar o obscurantismo.

Apesar de termos visto a nossa recomendação rejeitada, continuaremos a lutar para que a tomada de decisão, o desenvolvimento de políticas públicas no Município de Lisboa tenham por base a evidência científica e o melhor conhecimento técnico existente.