É com surpresa que reagimos ao anúncio do Sr. Ministro da Educação, Ciência e Inovação sobre a reforma do MECI, nomeadamente no que diz respeito à extinção da FCT e da ANI e à sua fusão numa única entidade – a Agência para a Investigação e Inovação. Este anúncio, feito a 31 de julho, num momento em que a maioria dos intervenientes do setor se encontra a iniciar o período de férias, dificulta qualquer reação ou esclarecimento atempado. Esta é uma decisão que deixa grande parte da comunidade científica insegura e ansiosa, com inúmeras dúvidas sobre o futuro imediato, como por exemplo:
- Qual é o plano para esta transição?
- Que entidade assegura a continuidade dos contratos em vigor?
- O que acontece aos concursos já anunciados?
- Qual será o destino do programa FCT-Tenure, dos laboratórios associados e dos centros de investigação?
- Como serão garantidos os financiamentos assegurados pela FCT durante o período de transição?
Certamente o Senhor Ministro refletiu sobre estas questões, mas o processo foi anunciado sem consulta à comunidade científica e de forma que nos parece desnecessariamente precipitada. Desconhecemos qual é o plano do Governo: o como e o quando da operacionalização desta alteração.
A FCT foi a instituição que possibilitou o crescimento de uma comunidade científica em Portugal. E sendo verdade que a FCT carecia uma urgente reforma, que a pudesse capacitar para dar respostas ágeis às necessidades da ciência que se faz hoje em Portugal, garantindo estabilidade e previsibilidade nos financiamentos e nos seus prazos, esta fusão com a ANI não é a resposta que esperávamos, porque não vem resolver nenhum destes problemas e cria outros. Um deles é que desconhecemos que estratégia terá esta nova agência na sua tutela partilhada entre o Ministério da Educação e Ciência e Inovação e o Ministério da Economia e Coesão Territorial.
É que por exemplo a ausência da palavra Ciência no nome da nova agência é já um sinal preocupante no que diz respeito à aposta na investigação em ciência fundamental, cuja importância é quase sempre esquecida quando se fala de economia e inovação. Na conferência de imprensa o Sr, Ministro falou principalmente em “impacto, impacto, impacto”. Esperemos que as garantias de manutenção de financiamento para a investigação fundamental se concretizem e não entrem em contradição com este aparente foco na investigação de impacto. Porque é imperativo que não se deixe reduzir a Ciência a um ativo de mercado, reconhecendo-lhe sempre o contributo para o progresso e o desenvolvimento humano, que deve ser entendido num plano muito mais amplo do que a geração de novos produtos.
Importa também sublinhar que é sempre mais difícil construir do que destruir. Reestruturar o sistema científico exige uma visão muito clara, que até ao momento não foi apresentada. E por isto também expressamos enorme preocupação com o faseamento da transição. O anúncio da fusão da FCT com a ANI aponta para uma mudança imediata, sem liderança eleita e sem garantir a continuidade de processos dos quais o sistema científico depende. Uma alteração desta dimensão exige planeamento, estabilidade e diálogo com a comunidade académica e científica, algo que manifestamente não se verificou durante o processo que levou a este anúncio inesperado e repentino.