Por uma Cidade vivida em segurança: reparar os nossos espaços públicos

Por uma Cidade vivida em segurança: reparar os nossos espaços públicos

A sinistralidade rodoviária tem um impacte que vai muito além dos utilizadores dos veículos motorizados. Este drama é particularmente sentido nos nossos espaços urbanos, sendo urgente tornar as nossas cidades verdadeiramente seguras para todos. O LIVRE associa-se às evocações da memória de Patrizia Paradiso, e convida à reflexão mas sobretudo, à ação.

Como noticiado há um ano, entre 2010 e 2018 foram atropeladas mortalmente quase 1400 que circulavam a pé, cerca de 80% dentro de localidades 1. Entre os 28 estados membros da UE, o nosso país posiciona-se no 5.º lugar dos piores em relação aos índices de mortalidade de peões, de acordo com um estudo do European Transport Safety Council. O rácio de peões mortos em vias urbanas é particularmente elevado, significando que as nossas localidades não são seguras para a mobilidade pedonal.

Sem surpresa, os países que apresentam melhores indicadores de segurança para os peões são os que mais promovem um desenho urbano que não depende da mobilidade individual em automóvel, mas que, pelo contrário, apostam na mobilidade suave e no transporte público.

Com dados mais recentes, a Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta (FPCUB) vem recordar que em 2019, sem efeito da pandemia, houve 35704 acidentes com vítimas, resultando em 626 vítimas mortais, das quais 26 eram utilizadores de bicicleta, e 134 eram peões, correspondendo a 26% das vítimas mortais 2.

O LIVRE defende uma alteração radical da prioridade do tráfego na cidade, promovendo uma abordagem integrada que conjugue os diferentes modos de transporte e reduza a dependência do automóvel particular.

As prioridades do LIVRE a nível de mobilidade passam por criar condições nas nossas cidades que permitam reduzir a necessidade das deslocações de maior distância, promovendo a vida de bairro, o teletrabalho, e o acesso aos serviços de forma mais descentralizada. 

É também urgente implementar medidas de redução da sinistralidade, facilitando a mobilidade de peões e pessoas com mobilidade reduzida, apostando num desenho urbano de qualidade.

O desenho das nossas Cidades deve criar vias separadas para os diferentes modos de transporte, com enfoque em passeios confortáveis, amplos, integrados com os elementos da Economia Local, e com ciclovias paralelas de dimensão adequada, com um traçado adequado à utilização no dia-a-dia, convenientemente separadas das restantes vias de circulação. Muitas das ciclovias já existentes foram projetadas de forma tímida, sem correta separação de outros elementos urbanos como a rodovia, passeios, e paragens de autocarro. Verifica-se que não são efetivamente seguras nem práticas: devem ser revistas.

É também fundamental acalmar o tráfego rodoviário em meio urbano, criando bairros com velocidade limitada a 20 km/h, e limitando as velocidades de circulação a 30 km/h em todas as outras vias não exclusivas a automóveis. Estas mudanças devem ser sempre acompanhadas de campanhas de sensibilização para uma nova forma de encarar a mobilidade.

A flexibilidade da mobilidade deve ser promovida através do melhoramento dos sistemas de transporte público, pensados ao nível intermunicipal e ao nível intermodal, permitindo a redução da utilização do automóvel particular na Cidade, tanto por quem nela habita como por quem a ela acede.

Estas mudanças da forma de viver a cidade devem ser feitas em conjugação com os seus habitantes, promovendo o envolvimento da Comunidade no desenho dos seus espaços.

Tal como Jan Gehl afirmou, “primeiro moldamos as cidades, e depois somos moldados por elas”. Urge reparar os nossos espaços públicos.

Referências:
1. “Portugal entre os piores da UE nas mortes de peões no espaço urbano”. Público, 16/julho/2020

  1. “Andar ou Pedalar em cidades vivas com segurança”. Comunicado da Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta (FPCUB). 30 de junho de 2021